pandemia do coronavírus iniciada em 2020 trouxe à tona uma reflexão importante em nossas vidas. Falamos muito sobre o excesso de consumo que promovemos como sociedade e todos os impactos ambientais que isso causa. Um dos pontos principais que esse tema toca é na produção de lixo.
Se ficar em casa nos trouxe uma proposta de cortar aquilo que é supérfluo das nossas vidas, também nos apresentou uma realidade cruel. Passamos a fazer mais compras online, e com isso geramos ainda mais lixo em forma de embalagens. Sim, muita gente tentou minimizar o impacto ambiental fornecendo embalagens de papel em vez das tradicionais, de plástico, mas passamos a reciclar mais?
E, mesmo antes da pandemia, você já parou para se perguntar quanto de lixo gera na sua vida? Os nossos alimentos vêm embalados, precisamos de uma série de produtos de limpeza e higiene pessoal, os restaurantes que frequentamos precisam lavar seus utensílios… não importa para onde olhamos, há produção de lixo.
Se essa situação parece incontornável, a ativista Cristal Muniz tem se dedicado a mudar certos padrões de consumo e de comportamento para que possamos fazer nossa parte. Ou, pelo menos, um pouquinho dela.
Designer gráfica e hoje cursando nutrição, Cristal cresceu na época em que os blogs eram a coqueluche da internet. Um dia, descobriu o trabalho da ativista norte-americana Lauren Singer, e ficou comovida. “Vim morar sozinha no meio da minha primeira faculdade, aqui em Florianópolis, e passei a ficar muito incomodada com a quantidade de lixo que produzia. Me impressionava, porque eu não era uma pessoa com dinheiro suficiente para ser consumista”, explica. “Não comprava roupa toda semana, mas sim comida, pasta de dente, produtos de limpeza para casa.”
“Vim morar sozinha no meio da minha primeira faculdade e passei a ficar muito incomodada com a quantidade de lixo que produzia. Me impressionava, porque eu não era uma pessoa com dinheiro suficiente para ser consumista”
A jovem, hoje com 29 anos, não se considerava uma pessoa muito preocupada com lixo nessa época. Fazia separação de seu lixo para a reciclagem, mas só: “Toda semana, descartava cerca de cinco sacolinhas de resíduo, entre recicláveis e não recicláveis, coisas que iam desde a areia suja da minha gata até o lixo do banheiro.” Mas, nada a incomodava mais do que os restos de alimento, que representam pelo menos 50% de todo o lixo que produzimos em nossas vidas: “O lixo da cozinha me incomodava profundamente, o ritual de colocar o resto das comidas em um saco plástico, que ficava fedorento ao longo dos dias, e depois jogar no lixo do prédio.”
O trabalho de Lauren Singer no blog Trash is for Tossers inspirou Cristal a tentar algo impensável para muitos de nós: ficar um ano sem produzir lixo, trabalho que ela decidiu compartilhar no blog Um Ano Sem Lixo – e que hoje, com muito sucesso, se tornou Uma Vida Sem Lixo. Não é que Cristal não produza absolutamente nenhum resíduo, mas dá para dizer que ela virou sua vida de cabeça para baixo a fim de encontrar soluções sustentáveis para sua existência terrestre.
“Logo no início das pesquisas, descobri que tinha muita coisa que não saberia responder para os leitores, ou para mim mesma. Percebi que aquele ano seria um aprendizado de como ficar sem produzir lixo”, conta Cristal. Fez sucesso e, de repente, ela encontrou online uma audiência que, como ela, estava incomodada com a maneira que se relacionava com o meio ambiente. Hoje, ela é uma das maiores autoridades no assunto aqui no país e palestrante requisitada.
Mas, mudar de hábito não é fácil, principalmente se você quer fazer uma revolução particular. Cristal entendeu isso logo nos primeiros dias em que passou a reduzir a quantidade de lixo que produzia: “Eu me questionava quais os primeiros passos, porque tudo o que fazemos produz lixo, e são muitas coisas possíveis de se fazer. Então, bolei um kit lixo zero”, explica. “Na época, eu trabalhava em um jornal, então produzia resíduos descartáveis durante as refeições. Preparei guardanapos de pano, um copo só meu, talheres, e passei a andar com tudo dentro de um potinho, na minha bolsa.” Depois, Cristal comprou uma composteira para sua casa e um coletor menstrual. “Resolvi o problema do lixo orgânico, algo que detestava, e passei a evitar o uso de absorventes descartáveis. Meu primeiro foco foi resolver os lixos que nem eram recicláveis, que param direto em aterros sanitários.”
A ativista percebeu que as grandes mudanças estavam nas pequenas atitudes. Trocou o papel higiênico por um ducha higiênica. Encontrou uma loja de produtos a granel para não precisar comprar arroz, feijão e outros alimentos embalados em plástico – ela leva seus próprios potes e enche com a comida –, passou a fazer seu próprio sabão líquido e sua pasta de dente. “O mais difícil em relação aos hábitos é quando você está lidando com outras pessoas. Causa estranhamento ter que pedir sem sacolinha, explicar que é para por diretamente no seu pote, em vez da embalagem. É mais difícil mudar quando envolve relações sociais”, ela conta.
Se você chegou até aqui e está achando muito complicado aplicar essas noções para a sua vida, fique tranquilo, pode ser só preguiça de tentar. Cristal afirma que todas as suas dicas são extremamente fáceis de fazer, e que suas receitas duram bastante, não se tornam algo oneroso no cotidiano de quem sai todo dia para trabalhar e chega à noite em casa. “Faço desodorante a cada dois meses, sabão líquido também. Vinagre é só deixar cascas de fruta com água e açúcar em um pote. O pó dental, se eu cronometrar, demora dois minutos entre levantar da cadeira, pegar todos os potinhos com os ingredientes, misturar no potinho do pó dental, fechar, guardar e botar o potinho no banheiro”, ela diz. “Eu diria que produzir lixo, levar uma vida comum, é mais trabalhoso. Você tem que desembalar as coisas, descartar embalagens, lavar embalagens, abrir as compras e botar em outros potes. Acho que dá mais trabalho. Porque não produzir lixo é simplificar a vida, precisar de menos coisas.”
Nós pedimos algumas dicas de como reduzir o lixo para Cristal, um incentivo para que nosso 2021 seja diferente. Confira: