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Coisinha tão bonitinha da mãe

Com uma delicadeza que inspira, Luana Carvalho fala sobre música e maternidade, dor e cura no processo de perda da mãe, a eterna Beth Carvalho

por Kleyson Barbosa Atualizado em 30 jul 2020, 11h13 - Publicado em 30 jul 2020 01h41
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(Estúdio Lambada/Ilustração)

ntes mesmo de nascer, Luana Carvalho já era destaque nas telas, ao aparecer na barriga de Beth Carvalho em programas como o Fantástico e o extinto Alerta Geral, apresentado por Alcione. Foi com o apoio da mãe que, após atuar em novelas nos anos 2000, a artista se debruçou sobre a música para se lançar como cantora e compositora. Enquanto participava de shows ao lado de Beth, sua filha única foi encontrando a própria turma, e divulgou há sete anos sua primeira gravação, uma versão sedutora de Sintonia, balada de Moraes Moreira.

Essa reportagem fica mais gostosa se você der play aqui:

Depois de dois álbuns, um deles só com composições próprias, Luana nos apresenta seu mais recente trabalho, Baile de Máscara, uma homenagem carinhosa para a mãe, que morreu em 30 de abril do ano passado. O disco, lançado durante a quarentena e produzido por ela e Kassin, traz em sua essência Beth e é também um álbum sobre Carnaval e confinamento, assuntos que permeiam este bate-papo.

Numa conversa franca com a Elástica, a artista fala ainda sobre o luto da perda da mãe, a maternidade e arrisca um palpite sobre a folia do ano que vem. Como um diamante riscando o outro, pontua suas diferenças políticas em relação a Beth e se vê como fruto de uma situação de machismo estrutural ao falar do pai. “Ele é esse cara que teve 9 filhos e praticamente não educou nenhum”.

Para complementar, preparou também uma playlist de sambas exclusiva para você que lê esta entrevista. São gravações preciosas dos anos 1940 a 2010, nas vozes de Geovana, Zeca Pagodinho, Noel Rosa, Paulinho da Viola, Mart’nália, Martinho da Vila, Cartola e inúmeros outros. Nossa sugestão é apertar o play para ler o papo abaixo.

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(Ana Alexandrino/Divulgação)

Por que você canta, Luana? Existem filhos de grandes cantores que não cantam nem no chuveiro.
Eu canto porque eu escrevo,  e a música acabou se tornando a maneira de comunicar a minha escrita. Escrevo desde muito nova e acho que é a manifestação mais genuína que tenho. A música acabou sendo esse canal entre mim e quem pode chegar às minhas palavras.

Como foi o processo do seu último álbum Baile de Máscara, lançado durante o confinamento. Ele já estava planejado?
Eu estava gravando o meu próximo disco, de inéditas, que a princípio sairia no segundo semestre. Já tinha gravado algumas coisas, aí aconteceu um inusitado, porque foi tudo muito rápido, esse disco foi feito em duas semanas. Chegando abril, eu já sabia que vinha maio, e maio pra mim não é só um mês do belo outono do Brasil. Minha mãe morreu no dia 30 de abril, e no dia primeiro de maio ocorreu o velório e a cremação. Dia 5 era aniversário dela e do meu avô, e dias depois viria o Dia das Mães. Seria um mês difícil, e eu sabia que eu ia ter que fazer alguma coisa, porque a gente carrega mesmo essa responsabilidade com quem fica, com os fãs, com os compositores que ela lançou. Estava sem saber o que fazer, e decidi criar uma playlist (Quarentena de Cinzas, divulgada no dia 30 de abril). E, durante o processo dessa playlist, nasceu o disco.


“Eu canto porque eu escrevo,  e a música acabou se tornando a maneira de comunicar a minha escrita”

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(Ana Alexandrino/Divulgação)

Eu vinha pensando muito sobre a saída do Carnaval e a entrada numa quarentena. O tempo todo pensava sobre os paradoxos e as semelhanças de um Carnaval e de uma quarentena que consigo enxergar. O estado de suspensão, a questão do contágio. A questão do Carnaval do povo e o Carnaval de quem assiste. Quem não pode parar de trabalhar, enquanto a gente tem o privilégio de ficar em nossas casas… É mais ou menos o que acontece no Carnaval quando você está no camarote e passam na avenida aquelas pessoas que ficaram o ano inteiro penando e que, de repente, se transformam em belíssimas alegorias da alegria, mas que se morrerem amanhã, como diz a letra de “Dia Seguinte” [penúltima faixa de Baile de Máscara], “é um pingente que cai que no ano que vem ninguém vai notar”. Eu achei que a minha mãe era um grande zepelim disso tudo, pelo seu repertório e porque seria muito importante pra mim fazer uma homenagem nesse momento. O disco veio e interrompeu o processo do outro álbum, que já voltou. Mas foi tudo fluido, como uma onda mesmo. Acho que é porque era uma coisa que vinha sendo feita há muitos anos.

Passado mais de um ano, você se sente confortável para dizer como está sendo esse período de luto?
Em um ano a gente ainda fica muito fora. Até aterrar, demora. Ainda me sinto muito sob a vigília desta morte. Acho que superar eu nunca vou, mas acreditar que exista uma vida verdadeiramente sem a minha mãe ainda é um processo. A morte dela não foi um susto, foi um processo longo de uns 15 anos. Eu tinha 25 anos quando a gente descobriu o câncer da minha mãe. E de lá pra cá foram vários processos, várias cirurgias. Eu me lembro de um ano que, em seis meses, ela entrou 22 vezes na sala de cirurgia. Fora as internações de um ano e meio. Tudo que você possa imaginar minha mãe fez. Foi um processo penoso, de muita expectativa frustrada. Minha mãe acreditou até o último minuto que tinha jeito e era doloroso assistir às frustrações dela. Ela tinha um câncer que não tem cura, mas acreditava em qualquer possibilidade porque era uma pessoa apaixonada pela vida. Eu fui perdendo muitas mães nesses 15 anos. Eu fui perdendo a mãe que anda, a mãe que senta, a mãe que deita, a que vive sem dor, a que vem até mim, a que pode fazer determinados programas comigo. Eu fui perdendo muitos prazeres. 

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dia do trabalhador

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De que maneira você conseguiu o conforto espiritual nesse sentido?
Eu sou de Ifá, que é o candomblé cubano. Sou filha de Oxum e de Ọrunmila. Mas minha fé é muito inconsciente. Por exemplo, eu me fiz em Ifá porque eu não sabia o que estava fazendo ali e isso era fundamental para mim. Eu tenho tanta tendência a racionalizar tudo que tinha certeza que, para conseguir me relacionar com a minha fé, precisava sair um pouco da cabeça. Minha relação com a espiritualidade está muito no meu corpo e no meu inconsciente. Com relação à morte… Eu acredito na morte como um descanso. A morte da minha mãe é o fim de uma vida a se comemorar, porque ela foi uma mulher que fez muito. Viveu 72 anos num nível absoluto de esplendor. E tem mais uma coisa: esse câncer da minha mãe é congênito, ela nasceu com ele. Ele poderia ter se manifestado quando ela tinha 20 anos e ela não teria sido a Beth Carvalho, mas se manifestou aos 60. Ela teve uma vida muito fortuita, embora tenha sofrido no final. E eu acredito muito que o processo de despedida do ser humano tem muito a ver com aquilo que ele precisa passar. Não é que a minha mãe merecesse o sofrimento, é que ela saberia viver daquele jeito. O que é uma mulher que canta deitada naquela circunstância? Ela estava ali como um serviço à humanidade. É possível estar definhando e ainda assim cantar. Como faz, em outra situação de saúde, obviamente, a Elza Soares. Eu acho que esses seres estão aqui cumprindo uma missão. A beleza do que ela viveu é muito mais profunda do que a dor que ela passou.


“Minha mãe acreditou até o último minuto que tinha jeito e era doloroso assistir às frustrações dela. Ela tinha um câncer que não tem cura, mas acreditava em qualquer possibilidade porque era uma pessoa apaixonada pela vida”

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(Ana Alexandrino/Divulgação)

Em inúmeras entrevistas, sua mãe falava que você queria ser atriz, mas achava que ia virar cantora. Aí você seguiu o seu sonho: fez Tablado, formação na CAL, atuou em peças, musicais, participou de América (2005), fez a Lili em Páginas da Vida (2006) e outros  trabalhos. Mas, nos últimos anos, parece que a profecia da sua mãe se realizou. Em que momento você deixou de lado a carreira de atriz para se dedicar à música e como foi essa decisão?
Acho que a coisa de ser atriz foi acontecendo, sabe? Tinha um sonho assim muito infantil e quando vi estava fazendo aquilo tudo. Fui indo no fluxo. Me chamaram pra fazer Malhação e eu, que sempre quis me sustentar sozinha, vi uma oportunidade. Surgiam os testes para fazer novela, eu fazia. Não era uma coisa que eu tratava assim como o meu ofício. Mas aí começaram a surgir umas situações. Um empresário de São Paulo resolveu acreditar em mim. De repente, a Diesel resolveu me patrocinar. Aí começou a ficar sério, porque começou a envolver gente, dinheiro, empresas, eu comecei a fazer novelas… Até a hora em que eu não dei mais conta, porque aquilo não me satisfazia em nenhum lugar. O que me satisfazia sempre foi escrever. Nesse processo, eu comecei a me relacionar com outros artistas que não eram de uma excelência virtuosista, o que foi me dando a noção de que eu não precisava tocar uma flauta como os Carrillo, tocar violão como o Rafael Rabello, que eu podia tocar um violãozinho, cantar o meu Latino com os meus acordezinhos. Eu fui tendo essa consciência aos 20 e pouco anos.

A profissão de cantora veio para mim muito como um ofício árduo, minha mãe sempre foi muito purista. Quando comecei a descobrir os meus processos de sonoridade, o que eu gostava verdadeiramente de fazer, não só pra ouvir, foi uma transição. Foi difícil chegar para o meu empresário que estava ali apostando tudo, chegar para uma empresa como a Diesel e dizer ‘obrigado, mas tchau’. Comecei a dar umas sabotadas em convites, em renovação de contratos, aí meu empresário mesmo me falou que achava que eu não estava mais querendo e que eu precisava pensar. Percebi que tinha muita música feita, muita coisa escrita, que tinha letras que achava que eram poemas, mas que na verdade eram letras de música. Comecei a ir juntando as peças, entendendo que esses anos todos, apesar de eu estar efetivamente atuando em outra coisa, eu já vinha construindo essa compositora.

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uma qq coisinha pq eu adoro essa música e tocar na cozinha coisas além de panelas

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Como sua mãe te apoiou nessa decisão?
Minha mãe sempre quis que eu cantasse, era minha entusiasta. Dizia que gostava muito de me ver fazendo três coisas: escrevendo, cantando e dançando. Ela inclusive me deu todo o suporte que eu precisava. Porque realmente saí de uma realidade de muito conforto. Naquele momento, eu não tinha como ganhar dinheiro com música. Aí comecei a trabalhar na BC Produções, uma empresa dela, para segurar a onda, para conseguir investir em todos esses processos. O que foi gasto nos meus dois primeiros álbuns, Sul e Branco, foi ela quem me ajudou, de todas as maneiras. Teve outra coisa muito importante que foi quando a minha prima, Luciana Carvalho, foi fazer samba e começou a fazer uma carreira trilhando o caminho da minha mãe. Isso foi muito bom, porque acho que aliviou a minha mãe. Ela queria que alguém fizesse isso, e esse alguém nunca fui eu. Eu não era e nem ia ser essa pessoa. Essa pessoa, no caso, é a Luciana. Isso foi uma virada muito importante na nossa história, porque ela conseguiu relaxar e verdadeiramente ouvir o que eu tinha pra oferecer como artista da música.

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(Clipe Carnaval/Reprodução)

Você falou sobre cantar o seu Latino com os seus acordes… Você tem feito covers de funks dos anos 1990 e muita gente comenta pedindo para você gravar um disco. Você tem algo em mente?
Já me fizeram uma proposta sobre isso. Eu tenho vontade, mas vai demorar um pouquinho. Primeiro, preciso terminar o meu próximo disco. Acabei de fazer um disco de intérprete, mas o meu interesse é mesmo cantar o que componho. Eu sou muito mais uma compositora que canta do que uma cantora que interpreta músicas de outros autores maravilhosos. Acho que depois de lançar o meu próximo álbum, talvez eu possa fazer um projeto especial com essa história. Não sei se um disco, mas alguma coisa vou fazer.

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só que aí ela resolveu ficar em pé pra fazer parte ♥

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Para o seu Baile, você procurou escolher um repertório pouco óbvio da Beth, com sambas que versam sobre o Carnaval sem se configurar necessariamente como sambas de Carnaval. Você arriscaria alguma ideia de como vai ser o Carnaval do ano que vem?
Acho que o Carnaval é uma suspensão, alegre e melancólica ao mesmo tempo. Não é à toa que existe a quarta-feira de cinzas. E tenho a sensação de que o Carnaval sempre deixa saudades. Mesmo o Carnaval que minha mãe teve, quando eu nasci, que foi super difícil, porque ela praticamente se separou do meu pai [o jogador do Corinthians, São Paulo e Palmeiras nos anos 1960 e 1970, Edson “Cegonha” de Souza Barbosa], eu acredito que tenha um estado nostálgico. Mesmo no estado absoluto de alegria, acho que toda situação de aglomeração é também uma situação de solidão profunda. É o pierrô e a colombina. O Carnaval é suor, bactéria, partícula, sujeira, poeira, materiais sintéticos… É um contágio. E a gente agora está justamente precisando estar longe de qualquer sulco, qualquer líquido humano. Então, ano que vem eu estou achando difícil… não sei mesmo o que que vai ser das nossas vidas. Eu oscilo muito, já estranho muita coisa. Eu acho esquisitíssimo quando vejo uma cena de filme, com pessoas juntas, sentadas num bar, se abraçando. O medo tomou conta. Sei que o ser humano é regenerável e que a gente se acostuma com as coisas. Ou seja, da mesma maneira que eu estou estranhando isso hoje, eu posso voltar a estranhar o que a gente está vivendo agora. Foi o que eu quis dizer no meu disco: o Carnaval vai ser um baile de máscaras?


“Quando minha prima, Luciana Carvalho, começou a fazer uma carreira trilhando o caminho da minha mãe foi muito bom, porque acho que aliviou a minha mãe. Ela queria que alguém fizesse isso, e esse alguém nunca fui eu”

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(Ana Alexandrino/Divulgação)

E por falar nelas, que máscaras estão caindo?
Muitas né? Quando eu vejo amigos que amo frequentando shopping, então… A gente passou por um processo político recente de máscaras caindo. Quantas famílias e amigos brigaram, quantas relações ficaram complexas. O Brasil ficou apartado. E foi uma questão, na minha opinião, de caráter. Política é caráter. Você pode estar enganado com relação a quem você acha que vai fazer aquilo que você gostaria que fosse feito pelo seu país, mas o que você acha que deve ser feito para o seu país é caráter. O que você acredita para o povo, como você trata as pessoas que trabalham para você, como você trata um garçom quando se senta no restaurante, tudo isso é política. Porque tudo isso é caráter. Eu acho que a gente já vinha de um lugar muito forte de máscaras caindo. Agora a gente está colocando máscara para ver máscaras caírem. Hoje, quem tira a máscara é o problema. 

A sua mãe tinha uma postura política muito forte. De que maneira isso te constituiu como ser político e influenciou no seu posicionamento?
Eu entendo o medo de muitas pessoas da minha geração quanto ao posicionamento. É claro que já tive dúvidas, ainda mais porque eu nasci numa geração criada pela Globo. Quando você quer ser ator e uma empresa tem o monopólio midiático e é quem define a situação financeira de uma grande maioria de artistas do país… Imagina?! A gente viveu isso, antes da internet, inclusive. Vi muitas situações de corte por causa de posicionamento político, vi na minha frente. Então a gente tinha medo. Agora, estamos em outro momento do mundo e essa transformação trouxe muito aprendizado. Vejo muita gente mudando. Minha mãe realmente sempre foi essa pessoa que não teve medo de dizer o que pensava e passou muito perrengue por causa disso. Eu vivi isso também. Passei por momentos de achar difícil, porque via minha mãe sofrer e talvez não quisesse passar pela mesma coisa. Cheguei a sofrer bullying na escola. Tive situações por causa do posicionamento dela. Não concordo com tudo o que a minha mãe pensava, mas acho incrível como ela se posicionou e fico feliz de ver as pessoas se posicionarem.


“Mesmo no estado absoluto de alegria, acho que toda situação de aglomeração é também uma situação de solidão profunda”

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(Ana Alexandrino/Divulgação)

Como você se vê diferente da sua mãe?
Ela era uma pessoa muito radical em tudo, muito intensa. Então era 8 ou 80. Preto e branco, preto e branco. Ela nunca entendeu o cinza. Eu vim na vida da minha mãe para ser o cinza, a ponderação, os quinhentos outros pontos de vista possíveis, porque ela tinha um. Ela estruturou desde muito nova uma situação profissional. Meu avô foi preso pela ditadura, e ela teve que sustentar a casa dando aulas de violão. Resolveu sair da gatinha gostosinha da bossa nova para virar uma representante do povo brasileiro através do samba. Ela tinha que ter tudo muito definido. Não dá pra você chegar numa roda de samba sendo branca da Zona Sul e ter dúvida sobre algum assunto. Não dava pra você ter dúvida sobre nada na situação dela. Ela tinha que ter muita certeza das coisas. Então, construiu uma persona muito convicta, muito debruçada sobre determinados alicerces quase emblemáticos. E eu sou muito diferente disso. Se a gente for pensar astrologicamente, minha mãe é uma taurina, e eu sou peixes, com gêmeos, libra e aquário. Eu só tenho ar no meu mapa astral. Para mim, tudo é possível, tudo é fluxo. Minha mãe não entendia amanhã, para ela era tudo hoje. Para mim, é tudo para depois de amanhã, se precisar, se der pra ser. A gente tem esse encontro de almas de muito aprendizado. Ela me ensinou muito o hoje e eu a ensinei a fazer amanhã. Politicamente, vamos dar um exemplo, ela era alucinada pelo Fidel e diria que ele ficou aqueles anos todos porque todos os cubanos queriam que ele ficasse. Eu tenho certeza que existem cubanos que não gostariam. Conheço cubanos que fugiram de Cuba por serem gays e não serem aceitos. Então, se existe a possibilidade disso, com isso eu não concordo. Dentro de um espectro bethcarvalhístico de política ela diria “não interessa, tem uma coisa maior”. Eu entendo a coisa maior, mas eu me ligo nos vieses também.

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sim. meu cabelo já foi assim. a barriga também.

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A gente está falando de política e está falando sobre duas mulheres, você e sua mãe, muito em virtude do seu último disco. Como você se enxerga no movimento feminista?
Sou feminista, claro. E não nego os machismos entranhados na minha construção humana de caráter, porque sou criada numa sociedade extremamente machista. De uns tempos pra cá, acho que o que está acontecendo e que é muito importante, é que tanto as mulheres, e espero que cada vez mais os homens, estão mais sensíveis aos sinais, entendendo um pouco mais quais são as manifestações que provêm do machismo. Assim como quanto ao racismo. Está havendo um esclarecimento maior. Conversa-se mais, troca-se mais. Eu nasci de uma história de um pai que é isso que falei: minha mãe me pariu e meu pai foi para o Carnaval. Sendo que quem é do Carnaval é ela, por exemplo. Não tem nem justificativa, não é nem assim, minha mãe pariu e ele foi trabalhar ou foi jogar futebol, porque é o que ele fazia da vida. Não, ele foi pro Carnaval, ele foi fazer o que ela gostaria de estar fazendo, é sórdido. Então, sou fruto de um pai que teve 9 filhos, 7 mulheres e dois homens. Um gay, graças a Deus. Mas ele é esse cara, que teve 9 filhos e praticamente não educou nenhum.


“O que você acredita para o povo, como você trata as pessoas que trabalham para você, como você trata um garçom quando se senta no restaurante, tudo isso é política. Porque tudo isso é caráter”

Faz pouco mais de dois anos que você também é mãe, da Mia. Quais têm sido as descobertas da maternidade, e como tem sido essa troca e aprendizado com a filha?
É uma maravilha, tenho muita sorte. A Mia é como se fosse um pedacinho de convicção de que eu fiz alguma coisa certa nessa vida. Porque merecer esse serzinho é muito impressionante. Engraçado que eu estava falando das diferenças entre mim e a minha mãe e a Mia tem muita coisa da minha mãe e muita coisa minha também. Claro que tem o Pedro [Sá, pai de Mia] e muita coisa dele. Mas, pensando numa linhagem de mulher, minha filha, neta da Beth, tem a capacidade de ter potência através da força e através da delicadeza. Isso, primeiro, me conforta muito, porque ela fala da minha vida. Sou eu e minha mãe. E me ensina na contramão. A minha mãe era muito brava e eu sou um paradoxo estendido na areia. Posso ser muito brava, como pode ser muito amorosa e doce. Quando eu sou brava, que é uma coisa que eu tento não ser com ela, essas coisas que a gente tenta não repetir, a Mia ri. Ela acha graça da minha cara de brava. Eu tive que me virar nos 200 pra entender como fazer.

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(Luana Carvalho/Divulgação)
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