
solamento social, quarentena, pandemia. Entre tantas batalhas que precisamos enfrentar durante esse período difícil, a solidão com certeza tem sido um grande obstáculo. Não à toa, os casos de depressão aumentaram em quase 50% e os de ansiedade, em 80% desde o início da quarentena no Brasil, aponta um estudo da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Mas, na luta contra o vírus, muita gente se viu na necessidade de combater também a carência – que virou até tema de música.
Foi um pouco por esse incômodo de estar presa em casa, um pouco pelo repertório ideal para criar experiências que transformam, que Isabella Nardini teve a ideia de um novo projeto. “O que mais me fazia falta era poder acessar o frescor do desconhecido. Percebi que, ao acessar pessoas que eu não conhecia, podia acessar um novo mundo. Também sempre fui conectora, adorava receber amigos em casa e apresentá-los para outros amigos, e sempre tive muito ranço de aplicativo de paquera. Sempre achei que o melhor jeito de conhecer qualquer pessoa, seja qual fosse a finalidade, era através dos amigos. Eles são os nossos melhores curadores”, explica.

Essa é a premissa principal do Love is in the Cloud, experiência virtual de speed dating – encontros às cegas de cinco minutos – que acontece totalmente virtual, no aplicativo de videochamadas Zoom. Funciona assim: a partir da indicação de um amigo ou uma amiga, você é convidado para participar desses encontros, que acontecem toda quinta (se você for LGBT) ou sexta-feira (se você for hétero) à noite. Isabella e sua sócia, Roberta Tannus, enviam uma primeira mensagem recomendando que você se prepare para o rolê escolhendo um cantinho confortável na sua casa, preparando um drink ou tomando um vinho para “destravar” a timidez e escolhendo objetos que te representem para compor a cenografia que vai aparecer na câmera.

“Participei de um encontro profissional pelo Zoom e, dado momento, falaram que iam nos direcionar para salas privadas para que a gente discutisse o tema da reunião, era bem corporativo. Eu não conhecia aquelas pessoas, e na hora que falaram isso, me veio um frio na barriga. Foi aí que eu percebi: esse momento que antecede a entrada na sala com desconhecidos me deu o estalo do Love is in the Cloud. Queria proporcionar esse frio na barriga do risco, de não saber o que vem depois. Falei para a Roberta que tive essa ideia, ela já trabalhava comigo e, desde então, ela é a ‘teletransportadora oficial’ do projeto”, conta Isabella. Explicando: montado o cenário ideal para sua sequência de dates, você entra no Zoom na hora combinada e se depara com vários quadradinhos pretos – todos os participantes, inclusive você, estarão com câmera e microfone desligados. A trilha é daquelas românticas-cafonas-clichês-necessários-apaixonados, com direito a Love is in the air, para arrancar risadas e descontrair o clima. Isabella e Roberta falam um pouco sobre a dinâmica e começam os “teletransportes”: durante pouco mais de uma hora, elas vão pareando as pessoas entre si, em encontros de cinco minutos – com câmera e microfone liberados, claro 😉

Eterno enquanto dure
Os encontros às cegas duram cinco minutos cada um e as organizadoras do Love is in the Cloud afirmam: você precisa de, no máximo, três minutos para responder se aquela pessoa te encantou ou não. E, para dar um pontapé para que o papo não fique na mesmice de “o que você faz, quantos anos você tem, de onde você é”, Isabella e Roberta sugerem perguntas nada óbvias e até um pouco mais profundas – “o que eu, ou alguém, precisaria fazer pra você se sentir amado de verdade?”, “qual foi a coisa mais bonita que alguém já te disse sobre você? E qual foi a coisa mais bonita que você já falou pra alguém?” e “se você fosse me dar um presente, só de me olhar assim, o que você me daria?” são algumas das provocações iniciais

Cada vez que um date termina, todos voltam para a “sala principal”, com câmeras e microfones desligados, para dar uma respirada, fazer anotações sobre o papo que acabou de rolar e se preparar para o próximo. Terminada a sequência (que, em geral, fica entre 8 e 10 encontros), Isabella e Roberta pedem que cada um escolha quem mais se identificou para, depois de cruzar os dados, ver se rolou um “supermatch”. Se sim – ou seja, a pessoa que você escolheu também te escolher –, ambos recebem os telefones um do outro para continuar o papo no WhatsApp (ou no FaceTime, ou no telefone, ou como acharem melhor). Caso contrário, todos os participantes da edição recebem a lista de arrobas do Instagram dos participantes e, caso queiram, podem fazer mais uma investida via inbox. Para terminar a experiência, rola uma festa, dessa vez com câmeras ligadas, chat aberto e DJ, para descontrair e permitir que os participantes continuem interagindo.

Manas, manos, minas, monas
A ideia de trabalhar apenas com indicações foi a maneira que Isabella e Roberta encontraram de garantir uma curadoria para a experiência e aumentar as chances de que os participantes saíssem da experiência satisfeitos. No entanto, assim como toda curadoria, é pelo filtro delas e de seus amigos – e de amigos de amigos – que essas pessoas são escolhidas. Isso nos leva a pensar: será, então, que o Love is in the Cloud realmente fura a bolha na hora de te apresentar a pessoas novas?
“É sobre trabalhar a confiança, então quem participa indica mais duas pessoas e elas estão automaticamente dentro, caso queiram, é claro. A única coisa que pedimos é o preenchimento de um formulário para tentar checar se a pessoa não vai ser desagradável ou desrespeitosa. Essa dinâmica, no entanto, faz com que o projeto se espalhe muito rápido. O crescimento também nos faz pensar em abrir uma vaga por encontro para pessoas inscritas, que não tenham sido indicadas. A gente quer continuar assim pra manter um ambiente seguro”, explica Isabella.
O Love is in the Cloud começou apenas com uma versão para pessoas heterossexuais, mas, há quase um mês, as versões LGBT também acontecem semanalmente, às quintas-feiras. E, é claro, algumas coisas precisaram ser adaptadas. “Foi um desafio maior do que a gente tinha imaginado. Nas versões LGBT, têm encontro entre todas as pessoas. Por isso, optamos por aumentar para 10 homens e 10 mulheres, que têm dates entre si dentro do mesmo gênero. Consultamos até um engenheiro pra fazer essa análise combinatória”, explica Roberta, que é head de operações do projeto.
Outra diferença que surgiu foi a mudança no “clima” das perguntas, que ganharam toques apimentados visto que, na percepção das organizadoras, o público LGBT se mostrou mais solto e disposto a entrar em temas picantes. “Até agora, sentimos que a natureza dos homens gays é muito mais engajada no processo, então entendemos que era preciso mexer no ritmo. Até as músicas, que a gente sempre seguiu na linha ‘amor brega’, também trocamos para algo um pouco mais sensual”, ela explica.
Para responder sobre a real diversidade que você pode encontrar no Love is in the Cloud, ouvimos quatro participantes – dois da versão hétero, dois da versão LGBT. Os depoimentos na íntegra você confere aqui embaixo. Mas, correndo o risco de dar um spoiler (e uma dica), aí vai: se você está solteiro ou solteira nessa quarentena e gostaria de conhecer alguém novo, essa pode ser um bom caminho para se surpreender.