Quando o desastre na política está instaurado, quem mais trabalha é a assistência social. São os programas institucionais e o movimento social que procuram evitar que as pessoas passem fome, morram de frio, tenham um lugar seguro para dormir e tentem recomeçar suas vidas. O aumento do desemprego, o déficit de moradia, a falta de cuidado com a saúde mental, a inexistência de uma política séria sobre o abuso de álcool e drogas, e, sobretudo, a incompetência do desgoverno para lidar com as consequências da pandemia fazem com que a população em situação de rua aumente a cada dia.
Atualmente, cerca de 24 mil pessoas (uma população majoritariamente negra) estão em situação de rua na cidade de São Paulo. Esse cenário – dramático e evitável – motivou a criação de uma série de serviços emergenciais. Após muita pressão sobre os órgãos públicos, foram instaladas tendas para distribuição de sopa, novas vagas em centros de acolhimento temporário e pontos de acesso à água. Foram iniciativas importantes, sem dúvida, mas que apresentaram alguns problemas, como mau funcionamento de chuveiros elétricos, falta de higienização dos cobertores e alimentos em condição imprópria para o consumo. Ainda assim, repito, foi uma iniciativa inédita, resultado da ação em conjunto do movimento social com o Legislativo, exigindo respostas do Executivo.
“Agora que a primavera chegou e a gente espera um solzinho pra aquecer nossos corações, recebemos o anúncio do fim de toda essa estrutura que foi montada para atender os nossos irmãos e irmãs de rua. Mas aí eu pergunto: depois do inverno as pessoas não precisam mais beber água e tomar banho?”
Pois bem: agora que a primavera chegou e a gente espera um solzinho pra aquecer nossos corações, recebemos o anúncio do fim de toda essa estrutura que foi montada para atender os nossos irmãos e irmãs de rua. Mas aí eu pergunto: depois do inverno as pessoas não precisam mais beber água e tomar banho? Não precisam mais se alimentar? Não precisam mais ter um lugar seguro para dormir e guardar seus poucos pertences? Esses serviços, criados emergencialmente, atendem a necessidades que não se encerram agora e, por isso, deveriam ser convertidos em uma estrutura permanente.
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Um dos primeiros serviços encerrados foi o programa Rede Cozinha Cidadã, que distribui 10 mil marmitas por dia. Ou seja: milhares de pessoas deixaram de comer, sem que fosse apresentada alguma alternativa. Revoltado com esse desrespeito ao ser humano, Robson Mendonça (mais conhecido como seu Robson), presidente do Movimento Estadual da População em Situação de Rua de São Paulo, se acorrentou ao portão da Câmara Municipal, em greve de fome. Da atitude corajosa e extrema deste senhor de 70 anos obtivemos uma grande vitória: a prefeitura voltou atrás e anunciou a continuidade do programa. Até dezembro. Uma solução temporária, mas que nos dá tempo para tentar construir um outro caminho.
É imprescindível que os governantes entendam que as políticas de assistência social não são assistencialismo e que devem ser permanentes, visando a manutenção da vida, da dignidade humana e oferecer soluções estruturais para a transformação social. Como presidente da Comissão de Direitos Humanos, posso afirmar que essa é uma das maiores demandas nessa pauta, que exige um trabalho comprometido e com um outro olhar sobre as pessoas em situação de rua, fora dos estigmas, da caridade e da repressão. É uma luta que não começou agora. Me sinto profundamente honrada em ter a oportunidade de continuar o legado de uma mulher porreta, nordestina, assistente social, que se tornou a primeira prefeita da cidade de São Paulo, em 1992. Luiza Erundina percebeu que o Estado é responsável por garantir os direitos básicos desta população e priorizou a criação das primeiras políticas públicas para as pessoas em situação de rua. Agora cabe a nós – legisladoras, ao Executivo e a toda a sociedade – trabalhar para que todas, todos e todes tenham condições de uma vida digna.
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