uito se discute e se estuda sobre a influência das redes sociais na percepção da beleza das mulheres. Além de pessoas com peles e corpos considerados padrão, agora temos filtros que transformam os traços do rosto, aplicativos que modificam as silhuetas, milhares de fotos de ‘antes e depois’ e relatos de mulheres que tratam cirurgias plásticas como se fossem uma necessidade ou um procedimento estético qualquer, cegando e embaçando a visão de milhares de garotas e mulheres sobre seu próprio eu. Em um estudo de 2019, registrou-se que o Transtorno Dismórfico Corporal (TDC) – distúrbio de preocupação compulsiva com a aparência – atinge 4,1 milhões de brasileiros, cerca de 2% da população. Nos é ensinado, desde cedo, que o corpo perfeito é a solução para todos os nossos problemas e algo que devemos almejar e conquistar quaisquer que sejam as consequências. Ter um corpo escultural – muito mais que a saúde associada a ele – é uma das maneiras que o patriarcado encontrou de deixar mulheres insatisfeitas por conta da eterna busca do impossível. E as redes pioraram muito esse quadro.
Os meios utilizados para atingir esse tal corpo perfeito parecem estar cada vez mais absurdos. A lipoaspiração, cirurgia plástica em que se aspira, com uma cânula, a gordura localizada da camada mais profunda – que é respeitada para que a cicatrização fique regular – pode não ser novidade. Mas a LipoLad ou Lipo HD, é. Nessa nova modalidade do procedimento, usa-se cânula menor para agredir de forma intencional a camada de gordura superficial, criando uma cicatriz interna e a impressão de uma barriga musculosa. “Esse tipo de lipoaspiração foi, inicialmente, pensada para atletas de alta performance que, mesmo malhando, queriam mais definição, para deixar essa capa de musculatura superforte mais visível. Ela foi criada para esse tipo de paciente, que é quase ninguém”, pontua a Doutora Renata Vidal, cirurgiã plástica que se posiciona contra a modalidade – e que explicou as diferenças entre as lipoaspirações para a reportagem.
“Esse tipo de lipoaspiração foi, inicialmente, pensada para atletas de alta performance que, mesmo malhando, queriam mais definição, para deixar essa capa de musculatura superforte mais visível. Ela foi criada para esse tipo de paciente, que é quase ninguém”
Dra. Renata Vidal
“Na minha concepção, são sequelas cicatriciais. Eu acho um absurdo. E o mais grave é que praticamente não é reversível. Para reverter, você teria que enxertar gordura no local, mas você não consegue o contorno regular”, continua a cirurgiã de Recife, que acredita em um atendimento mais humanizado no setor. Nesse tipo de cirurgia, mais agressivo do que a lipo comum, a agressão à camada mais superficial de gordura pode causar necrose, além dos outros riscos envolvidos na operação, como a perfuração de órgãos internos. Seguindo essa mesma lógica, há também a “Mirian Definition” que, em vez de emular os gominhos na barriga, faz a lipoaspiração na linha alba e nas linhas semi lunares, que são linhas laterais da barriga, deixando os ossos do quadril mais aparentes. “A lipoaspiração tem várias nomenclaturas, a maioria com finalidade de marketing, como se todo ano tivessem que lançar algo novo”, continua Renata.
Como tratamento, a lipoaspiração foi criada para eliminar gordura localizada e, inclusive, não é indicada para pacientes que querem emagrecer ou diminuir a flacidez – muito menos para mulheres que já são extremamente magras. “É um tratamento médico, que depende de uma avaliação, de um diagnóstico e de uma indicação adequados. Isso que faz da cirurgia plástica um procedimento seguro”, explica Dênis Calazans, presidente da Associação Brasileira de Cirurgia Plástica. Entender sua indicação médica é essencial para começar a entender o problema que vamos explorar aqui.