alar sobre menstruação ainda é um tabu para a sociedade. Por mais que esse seja um processo natural do corpo, muitas pessoas sentem vergonha ao abordar o tema. Essa falta de diálogo é prejudicial porque aumenta o desconhecimento e, consequentemente, a falta de políticas públicas para quem tem útero – impactando negativamente milhares de pessoas.
Um problema crescente que precisa ser tratado com prioridade é a pobreza menstrual, nome dado à dificuldade de acesso de meninas, mulheres, homens trans e pessoas não binárias com útero a produtos básicos para manter uma boa higiene nesse período do mês. Os absorventes descartáveis, calcinhas absorventes ou coletores são essenciais para conter o sangramento e fazer com que cada indivíduo cumpra suas tarefas diárias sem preocupação.
Os dados são alarmantes: um estudo feita pela Espro, em parceria com a Inciclo, chamada Pesquisa Novo Ciclo, mostrou que uma em cada três brasileiras de 14 a 24 anos já deixou de comprar absorventes por falta de dinheiro. E essa indisponibilidade já fez com que 32% delas deixassem de ir a alguma festa ou encontro, 20% perdessem um dia de aula e 11% faltassem ao trabalho. “Já desmarquei muitos compromissos por não ter como comprar absorventes ou ter uma quantidade limitada e precisar usá-los por muito tempo. Tinha medo de vazar e isso me impediu de ir para a escola, participar de aulas de educação física e de sair de casa”, revela Ester*.
Segundo a ginecologista Fernanda Martins, essa experiência desagradável afeta não só o cotidiano dessas pessoas, como também a saúde mental. “A perda de oportunidades leva a uma cascata de consequências, como falta de confiança, mudança de comportamento e sofrimento emocional.”
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Diversas causas estão ligadas a essa condição. A principal delas é a desigualdade social, que resulta na falta de renda para custear esses produtos. Isso porque a média de gasto com absorventes descartáveis por mês é de R$ 12,97. No ano, o valor sobe para R$ 144 – um montante alto para quem vive em situação de vulnerabilidade. No Brasil, sabe-se que 14,5 milhões de famílias estão na extrema pobreza, o que se traduz em 40 milhões de brasileiros vivendo com até R$ 89 por mês.
De fato, os dados da Pesquisa Novo Ciclo mostram que os grupos mais atingidos são jovens de famílias com renda total de até um salário mínimo (55%) e meninas e mulheres negras com renda de até dois salários mínimos (47%). Mas não para por aí: pessoas em situação de rua e as que estão no sistema penitenciário também são vítimas dessa falta de recursos.
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“Algumas famílias precisam escolher se destinam o dinheiro para comer ou para comprar absorventes. Já pessoas em situação de rua não têm recursos e nem como higienizar as partes íntimas”, ressalta Helena Branco, da ONG Girl Up. “Já as mulheres em situação de privação de liberdade não ganham esses itens no cárcere, o que as deixa sem opções no momento do ciclo.” A saída, nesses casos, é improvisar: utilizar jornais, guardanapos, pedaços de pano velho, miolo de pão e ou até mesmo folhas de árvores.
Acontece que esses substitutos são prejudiciais ao corpo, causando infecções difíceis de serem tratadas. De acordo com Fernanda, as doenças mais comuns são: candidíase, cistite, alergias e irritações na pele e na mucosa. “Esses itens são contaminados e não são apropriados para estarem em contato direto com o nosso trato genital”, explica. “Os casos mais graves levam à síndrome do choque tóxico, uma infecção que se alastra pelo corpo todo.” Apesar de rara, essa complicação pode levar ao óbito.
“Algumas famílias precisam escolher se destinam o dinheiro para comer ou para comprar absorventes. Já pessoas em situação de rua não têm recursos e nem como higienizar as partes íntimas”
Helena Branco