ara falar desse tema que pode ser um tanto quanto polêmico, preciso lembrar vocês de algumas coisas bem importantes. Uma delas é que, quando falamos de raça aqui no Brasil, frequentemente acabamos caindo em um senso comum de que se a pessoa não é branca, ela é ou preta ou indígena. Quando, na verdade, há uma série de etnias possíveis. O continente asiático, por exemplo, abriga diversos países bem diferentes. Ali, há japoneses, chineses, tailandeses, indianos, paquistaneses, sírios, turcos, libaneses, palestinos e muitos outros grupos que possuem uma imigração presente no Brasil.
Comumente, asiáticos são enquadrados como (quase) brancos aqui no Brasil e isso distorce nossas percepções como pertencentes a um grupo racializado e que detém discussões próprias, muitas vezes pós-coloniais, de refúgio, guerras e movimentações pelo mundo. Outra noção também muito importante é deixarmos de entender culturas como exóticas. Para falar disso, preciso pontuar alguns conceitos como orientalismo. Resgato aqui alguns trechos de um texto que escrevi recentemente sobre o assunto para a plataforma The Squad, chamado Des-Oriente-Se.
“Comumente, asiáticos são enquadrados como (quase) brancos aqui no Brasil e isso distorce nossas percepções como pertencentes a um grupo racializado e que detém discussões próprias, muitas vezes pós-coloniais, de refúgio, guerras e movimentações pelo mundo”
Edward Said foi um historiador palestino que contribuiu muito para os estudos pós-coloniais e é referenciado até hoje por muitos pesquisadores. Said nos apresentou uma leitura crítica sobre a compreensão dos termos Oriente e Ocidente. Sendo assim, apresentou também a criação de uma versão exótica e mística de um oriente do qual existe até hoje como uma manobra política de diferenciação e distanciamento entre culturas, mas que, na época das colonizações, foi formulado com uma tentativa implícita de justificar o poder colonial.
No texto, aponto que “a história como conhecemos hoje, registrada e catalogada cronologicamente como documento e como narrativa única nos livros escolares, é uma criação europeia, eurocentrada e que foi fortemente implementada pelas grandes navegações e colonizações”. Nas pesquisas de Said, ele menciona que a colonização não opera somente através da força bruta, mas também por poderes coercitivos, ou seja, através de manipulações visuais, mentais e sobre o conhecimento. Com a formação da grande História, a Europa registrou sua visão sobre o leste e sul global de forma complicada, de difícil compreensão, mística, sensual e depravada, criando assim uma noção tática de Oriente. Uma polarização inversa com as crenças do capitalismo que estava se formando, através do pensamento cristão, da propriedade privada, dos bons costumes, da procriação, da binaridade de gênero, entre outros.
Uma pergunta se instaura: Como são feitas as representações das culturas asiáticas, africanas, latinas e indígenas na cultura moderna? Quão bem controladas são essas representações a fim de manter um estereótipo e uma visão essencialista dessas culturas que são tão plurais internamente? “Precisamos entender como a ótica orientalista se coloca no discurso do dia a dia como uma consequência ainda operante do discurso colonial. Ela é uma lente, um filtro de Instagram que está nas nossas mentes desde nosso ensino básico e que a mídia perpetua”. Encontre o estereótipo, decodifique a ficção, desaprenda os mitos.
Dito isso, gostaria de falar agora sobre a Yoga ser um dos grandes domínios indianos que é exportado para o mundo todo. Vista principalmente como uma atividade física, esse treinamento religioso do corpo e mente têm sido globalmente administrado por uma elite branca e esse é um dos pontos que iremos destrinchar aqui. Vale mencionar também que, além da Yoga, outros itens culturais poderiam ser discutidos na mesma chave, como a Ayurveda ou a gigante utilização das religiões e filosofias indianas como uma forma hippie e romantizada de encarar a vida, muitas vezes utilizando-as para ofuscar e apagar as reais origens, fazendo manutenção das práticas de uma certa supremacia branca ainda muito operante.
Há, ainda, outra discussão muito importante que está ocorrendo atualmente por conta de o governo atual indiano usar a Yoga como manobra política para uma extrema direita, colocando-a ainda mais em uma estrutura nacionalista. O fato de a Yoga estar alinhada ao sistema de castas precisa ser minuciosamente observado para que as compreensão de Karma (lei do retorno e da causa e efeito) e Dharma (propósito de vida) não sejam manipuladas de forma discriminatória. Infelizmente, não conseguiremos entrar nessa discussão nesse texto, mas também não gostaria de ignorar que essa discussão merece muita atenção.
Vamos juntes?