em vezes que questões pessoais ficam tanto tempo nos remoendo que, em determinado momento, transbordam de nós. Quase como uma catarse. E ganham forma de lágrimas que vêm sem aviso, de infinitas conversas com amigos e em terapia, ou até mesmo através da arte. O jovem carioca Antonio Kuschnir, de 21 anos, é um dos privilegiados que consegue expressar suas angústias (e felicidades) pela última delas. Com tinta, pincéis e telas – algumas que ultrapassam o dobro de sua altura – ele dá forma a sentimentos, inclusive aqueles que ainda não sabe nomear, mas que precisam encontrar o caminho para fora, para o mundo.
Antonio vive um momento excepcional, histórico, diga-se de passagem: é o mais jovem artista a expor no salão principal do Museu de Arte Contemporânea de Niterói, no Rio de Janeiro, o famoso prédio circular projetado por um dos maiores arquitetos do Brasil, Oscar Niemeyer.
Nos primeiros dias de setembro de 2018, numa época em que o significado de pandemia, para a maioria, era ainda limitado aos livros de história, Antonio plantava a semente da exposição. Estava no terceiro ano do Ensino Médio e havia terminado uma prova de treino para o Enem. Enquanto esperava o fim da aula, desenhava no canto do caderno. Naquela circunstância, se debatia com alguns pensamentos. Um deles o deixava aflito.
No dia anterior, em 2 de setembro, o Museu Nacional do Rio de Janeiro havia sido destruído pelas chamas. Uma parte considerável dos momentos da sua infância foram ali. Havia uma história pessoal com o museu. Sua mãe, Karina, trabalhou 13 anos no local como pesquisadora no setor de Antropologia. E assim como 90% do acervo que virou cinzas, suas memórias pareciam entrar em colapso. Seu choro ganhava os primeiros rabiscos.
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“Toda arte é um pouco de uma mistura da nossa vida pessoal com as impressões do mundo em que vivemos”, diz ao lembrar.
No ano seguinte, as lágrimas se desdobraram em outras pinturas. Suas aflições, seus medos permearam as telas, dezenas delas. Traduzia, incansavelmente, o que sentia e o que via ao seu redor, mas ainda não enxergava uma coesão naquilo que criara. Até que veio a pandemia. Então, as aflições ganharam rosto. “O sentimento era de angústia somado ao isolamento da pandemia, com as figuras meio que presas e sem poder se mexer. Eu fui percebendo que tinha ali um fio condutor.”
Os sentimentos já não eram tão enigmáticos, pois o mundo todo compartilhava as mesmas angústias. “Parece que tudo começou a fazer sentido porque eu não estava apenas explorando questões minhas, mas questões da internet, do isolamento, da ansiedade e do medo.”