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A escola de samba é um lugar de produção do pensamento

André Rodrigues dedica sua vida ao Carnaval desde os 15. Neste ano, assina a direção criativa da Beija-Flor em desfile sobre a intelectualidade negra

por Adriana Terra Atualizado em 21 abr 2022, 13h06 - Publicado em 21 abr 2022 10h30
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(Clube Lambada/Ilustração)

s primeiras lembranças de escolas de samba que André Rodrigues têm são de ver a alegria e o respeito de sua família diante de cada pavilhão na arquibancada da Sapucaí. Mesmo torcendo para a Mangueira, quando a Beija-Flor passava sua mãe gritava “vai, povo de Nilópolis!”. O mesmo acontecia com a Grande Rio: “Vai, Caxias!”. “Então tem uma questão de pertencimento, territorialidade muito importante. E eu aprendi esse amor pelo cortejo com ela que me leva desde antes de eu ter um ano para assistir”, conta ele.

Aos 30 anos – metade deles trabalhando para escolas de samba –, o artista nascido na Baixada Fluminense se prepara para viver um Carnaval simbólico e aguardado, após um ano sem desfiles e dois de pandemia. Ele estreia como carnavalesco no Rio na Acadêmicos do Sossego, no Grupo de Acesso, e assina a direção criativa da Beija-Flor, no Grupo Especial. Em São Paulo, desde 2018 ele é carnavalesco da Mocidade Unida da Mooca, no Acesso 1.

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André chegou adolescente a um barracão e logo compreendeu que ali não havia outra postura senão a de aprendiz. Exercendo diversas funções como assistente, começou na Lins Imperial em 2007, passou por Grande Rio, Império Serrano, União da Ilha, Vila Isabel. Em São Paulo, onde atuou também em escolas como Águia de Ouro e Mocidade Alegre, a vivência no Vai-Vai, em 2012, foi central em sua formação.”

“Saí do Rio sabendo as dificuldades de ser um moleque preto, pobre, mas é no Vai-Vai que eu entendo o que é tudo isso. Mas principalmente entendo minha potência. Quando eu chego lá – sempre conto essa história –, o Lourival [Campos, diretor da escola falecido em 2020] me leva até o Fernando Penteado [baluarte da agremiação] e fala: ‘esse é o André, vai trabalhar com a gente. Veio do Rio e diz ele que é Vai-Vai’. Aí o seu Fernando pergunta: ‘me diz uma coisa se você é Vai-Vai… O Vai-Vai é preto e branco ou branco e preto?’. Eu falo: ‘é preto e branco’. ‘Pois é, o preto vem sempre na frente’, ele diz. Isso é potencialidade.”

É essa potencialidade que André busca explorar e honrar na avenida. Com a Beija-Flor, vai falar sobre a intelectualidade negra brasileira, em um enredo que reverencia a escola e seus sambistas, como o pioneiro Cabana, junto a nomes como Conceição Evaristo e Lima Barreto, posicionando as agremiações como espaços de produção de conhecimento.

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“A escola de samba é um organismo que a sociedade civil não entende. Ela sabe o que é o desfile, a escola ela não sabe o que é”, diz ele. “A gente está produzindo debate no país desde 1932. Desde o primeiro desfile, tudo que a escola de samba faz é debatido, mas a gente não é reconhecido como arte.” Leia abaixo a entrevista.

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A gente está prestes a viver um Carnaval super ansiado e, ao mesmo tempo, extenuante para as escolas. Como tem sido seus últimos dias?
Como esse Carnaval está durando dois anos, é aquela sensação de que está chegando, e quanto mais perto está, mais apertado você fica – aquela sensação de querer fazer xixi e estar chegando em casa. Por ora estou cansado, mas muito feliz do que a gente está conseguindo fazer. Acho que vai ser um Carnaval legal porque todo mundo vai conseguir mostrar o seu potencial máximo na avenida.

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(André Rodrigues/Arquivo)

Tem essa quebra de ritmo do ano, né, em fevereiro ficou essa coisa que não aconteceu totalmente, de “existe carnaval sem escola de samba?”…
Pois é, e está estranho porque os blocos aconteceram em fevereiro e agora estão voltando para a rua de novo, porque é isso, quem comanda o clima do carnaval do Rio de Janeiro são as escolas de samba. Essa cidade vive nos pilares de escolas de samba. Então não está parecendo fora de época, está parecendo um Carnaval de verdade, você tá vendo a galera na rua, o povo animadíssimo. Está sendo divertido ver isso, analisar essa cidade se comportando agora com as escolas indo para a avenida.

“Quem comanda o clima do Carnaval do Rio de Janeiro são as escolas de samba. Essa cidade vive nos pilares delas”

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(carnaval 2017 – figurino para união da ilha do governador / André Rodrigues/Arquivo)

André, você é bem jovem e já tem uma trajetória de muito trabalho, no Rio e em São Paulo. Como começa essa caminhada e sua relação com as escolas de samba?
A minha relação com escola de samba é uma relação afetiva. Minha mãe é uma pessoa que adora assistir aos desfiles, ela nunca foi de uma escola, mas sempre amou assistir. Inclusive hoje ela me mandou um recado avisando que comprou o ingresso. Desde 1985 essa mulher vai todos os anos assistir, desde antes de eu ter um ano completo ela me leva. E aí tem outras pessoas que são importantes nessa construção, várias tias, minha madrinha… E todas elas me ensinaram muito a questão do respeito pelas escolas, porque cada um torce pra uma: tenho uma tia que é salgueirense, minha mãe é Mangueira, minhas madrinhas são Portela. E elas sempre se respeitaram muito na arquibancada. Minha mãe me ensinou a gostar de tudo, sabe? Eu aprendi esse amor com ela. Minha mãe sempre foi empregada doméstica e a gente vivia todo ano a expectativa de voltar para a Sapucaí.

E aí, com 15 anos de idade, eu começo a tentar entrar nesse meio. Já que eu gostava tanto, eu comecei a procurar onde eu poderia estar mais próximo. Porque eu não desfilava… era igual à minha mãe, eu só desfilei pela primeira vez em 2005, na Caprichosos de Pilares, e dois anos depois comecei a trabalhar na Lins Imperial. Aí inicio minha trajetória como assistente de carnavalesco, começo a virar figurinista, depois eu trabalho muito como designer, depois eu viro projetista de alegoria, começo a trabalhar com projeto 3D e plantas e eu viro um assistente completo, fazia de tudo um pouco. Até chegar em 2012, quando fui para São Paulo e comecei a trabalhar também por lá. Eu adoro o carnaval de São Paulo, me formou muito, foi onde comecei a ser carnavalesco mesmo. Voltei para o Rio e agora estou tendo a oportunidade de ser carnavalesco de uma escola aqui pela primeira vez.

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(Carnaval 2020 – carro mocidade unida da mooca – enredo Abdias do Nascimento/Arquivo)

Quando você falou da sua mãe, das várias escolas, é interessante pensar nisso de perceber o que é comum a todas elas…
O que é comum a todas é a dedicação que todo mundo tem pelo seu pavilhão, acho que isso é o mais legal, saber respeitar a construção daquele pavilhão. Eu como artista hoje tenho muito isso, a minha arte não está acima, estou a serviço de uma entidade histórica que faz parte do processo da cidade, estou a serviço de uma comunidade, e o que tenho que fazer é criar soluções, criar um espetáculo que esteja à altura daquela história. Obviamente esse espetáculo vai passar pelas suas negociações, pelos seus percalços, mas como artista, a maior coisa que tenho que fazer é que essa escola desfile bem, bonita e que honre as suas histórias. A questão da minha mãe que me atravessa hoje, do respeito, é entender que cada escola tem a sua trajetória e a gente tem que analisar sempre isso.

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A minha mãe também me ensinou a gostar muito das escolas de samba a partir do local em que elas estão. Então, por exemplo, ela é mangueirense, mas quando a Beija-Flor desfilava ela falava “vai, povo de Nilópolis!”, quando a Grande Rio passava ela falava “vai, Caxias!”. Então tem uma questão de pertencimento, de territorialidade que é muito importante, e a gente como artista tem que entender isso. Quando a gente está fazendo um Carnaval como o da Beija-Flor que estou fazendo, não estou fazendo pra mim, mas pra Nilópolis, entende? É pra eles esse desfile, isso é o mais importante. Como estou fazendo o carnaval da Sossego pras pessoas de Niterói que participam dela, pro Largo da Batalha.

“Minha arte não está acima, estou a serviço de uma entidade histórica que faz parte do processo da cidade. Quando a gente está fazendo um carnaval como o da Beija-Flor, é pra Nilópolis, entende? Isso é o mais importante”

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(André Rodrigues e sua mãe/Arquivo)

Como era ser um adolescente pensando o Carnaval? O quanto os ensinamentos da escola de samba te formaram como profissional e como cidadão?
Como cidadão, tem uma coisa muito legal que é você lidar com a diversidade e as diversas inteligências que existem dentro de um barracão de escola de samba. Eu entrei pra um barracão antes de terminar o ensino médio e já tive que aprender que, por mais que eu estudasse, eu não saberia o que é um ofício de um carpinteiro, um ferreiro, um pintor de arte, um aderecista. Por mais que eu estivesse estudando inglês, estudando as equações matemáticas na minha escola formal, ali eu era mais um aprendiz, e eu trago isso comigo até hoje. Existem inteligências que eu não possuo, e aí eu tenho que contar com a experiência das pessoas. Aprendi o respeito por essa diversidade, por essa pluralidade de inteligências, e o respeito pela diversidade real, né? Com 15 anos, nunca tinha tido contato com travestis, trans, e isso dentro da escola de samba é extremamente normal, e isso me forma muito porque você fica amigo dessas pessoas já que trabalha com elas. Então, como cidadão, a escola de samba foi o melhor mundo pra me formar uma pessoa que entende e respeita a pluralidade e a diversidade das pessoas.

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(André Rodrigues/Arquivo)

Agora como profissional eu fui por etapas. Quando eu comecei, falava “quero ser um ótimo desenhista”. Quando eu achei que já estava fazendo um desenho bacana, “ah, eu quero aprender um pouco mais sobre projeção de carro alegórico”. Então eu fui meio que alcançando esses degraus aos poucos, e aí óbvio que vem a questão cidadã dentro disso. Para ser um ótimo projetista de carro, a pessoa com quem eu mais tenho que conversar e com quem tenho que aprender é com aquela que já faz isso há anos, que são os ferreiros. Aprender, dialogar, entender o que estou fazendo pra eles. Entender se algo é possível, porque o carnaval não é uma matemática tão exata, no sentido de que você não pode montar só uma alegoria e pronto, você tem que entender se aquele volume faz sentido no espaço da avenida. Nada está 100% pronto, a montagem do carnaval é uma coisa que só acontece na hora, então você tem que contar com a inteligência e a experiência dessas pessoas. O lado profissional vai muito do diálogo com as pessoas mais velhas.

“Entrei pra um barracão antes de terminar o ensino médio e já tive que aprender que, por mais que eu estivesse estudando na minha escola formal, ali eu era mais um aprendiz. Como cidadão, esse foi o melhor mundo para me formar uma pessoa que entende e respeita a pluralidade e as diversas inteligências das pessoas”

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(André em 2005, desfilando Caprichosos de Pilares/Arquivo)

Estava lendo que, em 2019, o enredo da Mocidade Unida da Mooca foi inspirado por uma história que você ouviu do [baluarte do Vai-Vai] Fernando Penteado sobre a origem dos pavilhões. O quanto a história oral é fundamental nas escolas de samba?
Acho que isso é o fundamento do carnaval, né. Ele é essa passagem eterna de bastão dos mais velhos pros mais novos e para quem está disposto a dar continuidade no processo da escola. Não só no processo artístico, porque hoje tem muito de enxergar o espetáculo, mas existe uma outra escola acontecendo dentro das quadras, na sociabilidade, e que é importante preservar mais do que o próprio espetáculo, aliás. O fundamento disso tudo está no que os mais velhos construíram, e aí é importante a gente estar sempre conversando com eles pra saber o que está fazendo, e dar continuidade, porque a negociação que a gente faz é inserir isso nesse mundo mais atual, mas os fundamentos são os mesmos.

Me lembrei de uma entrevista em que a Tia Cleuzi [também baluarte do Vai-Vai, falecida no início de abril] conta que falava para as crianças de sua ala que elas poderiam ser o que quisessem numa escola: passistas, ritmistas, carnavalescos, presidentes. Lembrei ainda do professor Silvio Almeida em entrevista de 2020 ao “Roda Viva” falando que as escolas de samba são o movimento negro. Essa noção de formação e comunidade de uma escola é compreendida de fora?
Imagina… a escola de samba é um organismo que a sociedade civil não entende. Ela sabe o que é o desfile, a escola ela não sabe o que é. Até porque a gente também não fala muito sobre isso. O apoio público para a escola de samba é para a realização do desfile, não para a manutenção daquele espaço, daquele organismo cultural. O próprio estado não entende isso, então quando ele dá um milhão para uma escola fazer o carnaval, ele está dando um milhão para que o evento aconteça, para que a disputa aconteça em um grande espetáculo que vai chamar também turistas, fazer parte cultural da cidade, OK. Mas basicamente é isso. O poder público não entende que há a necessidade também do investimento para que esses organismos funcionem como esses centros culturais, essas formações de escola horizontais, que não são a escola formal, mas onde você pode aprender a ser um dançarino, um carpinteiro, onde você pode aprender a ser um desenhista. Mas eles não sabem o que é escola de samba, não fazem ideia de como funciona, não sabem onde a escola de samba está. É complicado, mas não fazem ideia da totalidade da potência de uma escola de samba.

“O poder público não entende que há a necessidade também do investimento para que esses organismos funcionem como centros culturais, de formação. Mas eles não sabem o que é escola de samba, não fazem ideia de como funciona, não fazem ideia da totalidade da potência de uma escola de samba”

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A Beija-Flor neste ano vem falando da formação do pensamento a partir de referências afro-brasileiras. Fico pensando em uma branquitude que admira passistas, ritmistas em fevereiro, e vê isso separado do pensamento, a dicotomia corpo e intelecto. A frase “mas você não reconhece o que o negro construiu” do samba-enredo. Reconhecer essas construções é olhar o carnaval também de outra forma?
A Lélia [Gonzalez, filósofa brasileira] fala exatamente sobre isso, sobre como esse corpo é admirado no carnaval, mas durante o ano ele está, sei lá, nas cozinhas. É exatamente o pensamento dela, e o pensamento que a gente escolheu colocar no desfile, que é uma crítica à essa branquitude, à forma como somos objetificados, e como se coloca também a própria escola nesse lugar. O desfile da Beija-Flor termina louvando a construção da escola de samba como um processo de intelectualidade, um lugar de produção do pensamento. O Cabana – “ergui o meu castelo dos pilares de Cabana”, diz o samba – é esse fundador da escola que a gente leva pra avenida como um intelectual. Porque é um cara que é um puta de um compositor, músico, e também um agente social que funda uma escola e aquilomba todo o povo de Nilópolis, então o Cabana é um intelectual, assim como outras pessoas que constroem a Beija-Flor são intelectuais em suas áreas. E a gente acaba falando sobre essa intelectualidade não-acadêmica para que ela também seja louvada, porque nós pretos somos feitos disso. Boa parte da nossa intelectualidade também é feita fora da academia.

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(cartaz beija-flor 2022/Reprodução)

Quando a gente fala sobre a intelectualidade negra em vários lugares, sobre as várias manifestações da intelectualidade, ao terminar falando da própria Beija-Flor a gente coloca tudo isso numa linha horizontal: vocês são tão intelectuais quanto essas pessoas. E aí colocar essas pessoas da comunidade no mesmo patamar que esses intelectuais mais reconhecidos é mudar completamente o sentido da história, né.

Falar da intelectualidade negra também é pensar no destaque dado aos carnavalescos negros, de ontem e de hoje?
Com certeza. O carnaval constrói a sua ideia de intelectualidade a partir dessa branquitude que entra pra realizar os desfiles de escolas de samba, mais no Rio do que em São Paulo, porque a construção estética do carnaval do Rio é baseada na Academia de Belas Artes. São Paulo tem uma outra construção estética que é muito dessa intelectualidade fora da academia, e tem uma relação mais forte com o próprio movimento negro do que o Rio que, com a entrada do bicho e etc, as escolas se afastam disso. Mas sim, é extremamente importante a gente estar refletindo sobre isso, não só sobre não termos carnavalescos negros, mas abrir um pouco mais esse leque e falar sobre compositores pretos, porque é caro pra cacete fazer uma disputa de samba, então o dinheiro obviamente está na mão da gente branca. Falar sobre a falta de representatividade nos postos de poder, presidentes, direção, lugares também dominados por brancos. A Beija-Flor trazer de volta esse questionamento sobre quem está fazendo carnaval e que tipo de carnaval está sendo feito é um pouco pensar sobre isso. Porque uma das coisas que a gente espera, após esse desfile, após esse carnaval do “Empretecer o Pensamento”, é que as próprias representações de África e de afro-brasilidade nos desfiles sejam melhor vistas, que não sejam abordagens superficiais. E que isso demande uma pesquisa maior para poder retratar a forma plural que nós somos, a África entendendo a diversidade desse continente. Entender que ele não é feito só da cultura iorubá-nagô, que existem outras culturas pretas, nossas, que também podem ser louvadas, mostradas, e que quando a gente está construindo um carnaval na cultura iorubá-nagô, que seja, ou até banto, que são as mais fortes aqui, a gente entre com as referências certas e haja uma pesquisa maior em torno disso.

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(Exposição consciência negra - 2021 (SP) Conceito artístico de André Rodrigues/Arquivo)

Você fez a concepção artística da exposição da Consciência Negra em São Paulo em 2021. Como vê o trânsito de artistas de escolas de samba em outras esferas?
Na época eu falei com a Marta [Suplicy, secretária de Relações Internacionais da Prefeitura] sobre a importância de eu estar naquele espaço, mas que eu não fosse o último. Porque o artista que faz o carnaval basicamente faz o maior evento do país, mas a gente não é visto como artista institucionalmente. É visto como artista o cara que pinta um quadro, que faz uma instalação. Mas o que é uma escola de samba se não uma grande instalação errante? Então raramente estamos criando cenário, figurino para outros lugares, senão os mais renomados – aí você vai ter uma Rosa Magalhães fazendo teatro, um Renato Lage fazendo televisão –, mas outros artistas que estão criando os figurinos da maior festa do país, alegorias imensas, não são vistos como tal. Então participar da feira foi importante para provar que o carnaval é capaz de produzir isso. Ao mesmo tempo, procurei ser um cara de um estilo muito carnavalesco mesmo, porque é isso, carnaval é arte também, e eu sou um artista do carnaval. E acho que esse era o barato, provar e mostrar a grandiosidade da produção de uma escola de samba. Além de ter criado a cenografia, eu pedi que a produção fosse feita dentro de uma escola, porque a gente tem que ocupar esses lugares. A gente está produzindo debate no país desde 1932. Desde o primeiro desfile de escola de samba, tudo que ela faz é debatido, mas a gente não é arte para essas pessoas.

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(André Rodrigues/Arquivo)

Por falar em debate, quando os blocos resolveram que não sairiam oficialmente em fevereiro, houve discussões nas redes sociais e em reportagens sobre o carnaval de rua ser mais popular que o sambódromo. Isso tem a ver com a espetacularização do desfile? Apesar de ser uma visão deslocada do cotidiano de qualquer escola de samba, às vezes me parece que ela “colou”…
É a falta de conhecimento das pessoas sobre escola de samba. Então é muito fácil falar que ela é elitizada quando só é enxergada dentro da Sapucaí, do Anhembi. Não falam que quem está desfilando são 3 mil pessoas de uma comunidade. É mais simples falar que é um evento elitizado, para desmerecer. A gente é colocado nesse lugar para desmerecimento real daquilo que a gente produz. E aí se a gente vai entrar no debate do quanto isso é racista e preconceituoso, não acaba hoje…

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As escolas sempre estiveram na rua, e por mais de um mês. Existe um processo de desmonte das escolas de samba e ele também passa por esse debate sobre a rua, sobre o bloco, sobre o que é o carnaval legítimo e não é. Devolver para as escolas de samba essa imagem de produção preta devolve essa narrativa pra gente, porque tira essa coisa do debate branco da escola de samba, de que a escola é do branco, empresário. Não é. Ela é nossa, é uma produção nossa. E aí, para esse debate, eles não estão prontos.

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