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Malfeitona na Cama Elástica

A tatuadora, criadora de conteúdo, comunicadora e darkzerah da Bahia responde nosso questionário

por Alexandre Makhlouf Atualizado em 16 jul 2021, 18h46 - Publicado em 1 jul 2021 23h54

Comunicadora, tatuadora, criadora de conteúdo, desenhista, fazedora. Helen Fernandez é tudo isso e atende pelo nome de Malfeitona nas redes sociais, alcunha que surgiu principalmente pela estética que ela adota, longe dos padrões estéticos e dos realismos que costumamos ver por aí. “Não escolhi um caminho para desafiar a estética padrão ou qualquer estética. Para mim, é bonito. Não senti que estava me desafiando nem sendo diferentona”, ela conta. A insistência nessa estética, no entanto, foi mais pensada. A visibilidade que ela teve com seus desenhos, aumentaram também as críticas e sua vontade de questionar. “Esse conceito de bonito e feio é, além de pessoal, uma armadilha para que só consideremos bonito o que está dentro de um padrão. Acho interessante tensionar esses limites. É bonito por quê?”

Porta retrato Malfeitona

Desafiar a estética não está só em seus desenhos, mas também na forma de se vestir e na adaptação dos símbolos roqueiros – gênero musical que ela ama – para algo mais próximo de sua realidade: a vida em Salvador. Sua bio no Instagram entrega de cara: darkzerah da Bahia. “Muito roqueiro se acha disruptivo, mas esse DNA do questionamento tem a ver com o tropical também. Manguezal, caranguejos, cactos, tudo isso também é meio dark e resistente. Por que o cacto é menos extremo do que uma árvore sem folhas, que os roqueiros adoram? Havaiana preta is the new coturno.”


“Esse conceito de bonito e feio é, além de pessoal, uma armadilha para que só consideremos bonito o que está dentro de um padrão. Acho interessante tensionar esses limites. É bonito por quê?”

Além do trabalho de tatuadora e desenhista, Malfeitona também é criadora de conteúdo nas redes sociais. “Comecei a usar o Instagram para me alavancar como tatuadora, mas trabalhei tanto para isso que, hoje, sou oficialmente mais criadora de conteúdo do que tatuadora”, ela explica. Foi desse desgosto com as redes e com se sentir refém do algoritmo que surgiu a personagem Dona Algô, uma sátira do algoritmo do próprio Instagram, a personificação do que, do outro lado da tela, escolhe o que vemos, influencia o que compramos e, consequentemente, impacta no nosso bom humor. Ela é a estreante da nossa nova seção Cama Elástica, uma série de perguntas às vezes divertidas, às vezes sentimentais, que resgatam parte do passado de cada entrevistado e, ao mesmo tempo, o faz pensar no que vem por aí. E não poderíamos ter começado melhor. Olha só:

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Cama Elástica

Qual sua qualidade favorita sobre você mesmo?
Sou muito fazedora. Sou uma pessoa tímida, ansiosa, nervosa, toda vez que vou fazer algo novo, me dá vontade de vomitar. Mas eu não deixo de fazer. Faço de tudo, sou meio autodidata, meto a cara se eu estiver a fim de fazer. Me sentia um pouco solitária e sem ajuda, queria mais apoio em alguns momentos, mas hoje me sinto muito segura sendo fazedora. Uma das minhas poucas tatuagens conceituais é na mão, em letras pouco legíveis, o verbo “fazer”

Qual defeito seu você jamais mudaria?
Jamais mudaria o fato de eu ser crítica demais. Me prejudica um pouco – bastante – e me faz botar pressão nos outros, mas acho que é o que me dá bom senso. Me deprime um pouco ter esse olhar muito crítico (risos), mas muito da minha personalidade vem daí

Onde você procura buscar inspiração naqueles dias em que não quer sair da cama?
Sinceramente? Nas pessoas que eu amo e que me amam. Emocionalmente, sou completamente dependente dos meus amigos mais próximos e do meu homem (risos). Conto com essa ajuda das pessoas que me amam e que estão perto de mim. Não tenho vergonha de pedir ajuda ou apoio. São poucas pessoas para quem eu recorro, umas três que, coitadas delas, sempre me levantam. É errado? Sim. Ah, tem outra coisa: se eu ficar muito na bad, eu penso nas outras bads maiores que eu já tive e penso: ‘Se eu já passei por isso, eu dou conta de hoje’. Também penso que vou morrer algum dia, então prefiro não sofrer até isso estar mais perto.

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Qual música não sai da sua lista de preferidas?
Muito difícil de responder, sou muito apegada às coisas que eu gosto. Sou uma acumuladora de coisas, porque gosto de conhecer novas também. Linkin Park, System of a Down, Calcinha Preta, MPB que eu ouvia com meus pais… Não consigo dizer uma só.

Qual livro mudou sua vida?
Tereza Batista cansada de guerra, de Jorge Amado. Li quando eu era pequena, uns 10 anos, e mudou minha vida porque, primeiro, me deu um banho frio de consciência sobre o patriarcado, abusos que mulheres sofrem, situações de vida complicada, além de um despertar sexual que eu nunca tinha parado pra pensar – afinal, eu tinha 10 anos. Também uma Bahia muito intensa, de coisas que eu tinha contado já, não que necessariamente aconteciam comigo. Esse livro tanto pautou meu olhar para os homens, tirou meu véu de inocência, que às vezes eu penso que não deveria ter lido aquele livro. Também acentuou meu bairrismo baiano. A forma como Jorge Amado escreve, que parecia que eu estava ouvindo meu avô falar, me deu um despertar estético de que as coisas que você faz e cria não precisam seguir um padrão. Esse livro também tinha ilustrações de xilogravura de Calazans Neto e eu nunca as esqueci. Talvez tenha sido minha primeira influência mais direta, além dos muros de escolinha de bairro. Sabe aquelas Mônicas tortas? (risos). 

-
(Arte/Redação)

Descreva uma noite ideal para você
Ir para a beira da praia, com a água mais quentinha, bem parada. Noite fresca, mas aquela temperatura que ainda dê para entrar no mar. A companhia seria um grupo de amigos, pessoas para festar e tomar um negocinho até o dia amanhecer. Ou, então, uma noite em que eu criasse algo.

Dê uma gongada gratuita em alguém
Oh, criatura-pessoa-xis-que-não-sei-quem-é: se você tá muito incomodade comigo, com algo que eu faço, sem você nem me conhecer, isso tem muito mais a ver com você do que comigo, alguma frustração que você guarda e tá projetando em mim. Me deixa em paz!

Como foi seu primeiro beijo?
Foi num jogo de Verdade ou Consequência. Tinha duas pessoas na roda que eu estava afim, um menino e uma menina. Mas infelizmente nenhuma vez caiu para eu beijar nenhum deles. Caiu em outro menino, eu não queria fazer nada com ele e ninguém sabia que eu era BV. Ele chamava Brunão, é um menino muito legal (risos). Beijei ele na frente dos meus dois crushes, que se pegaram naquela noite e se pegaram várias outras vezes enquanto eu fiquei a ver navios.

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O que você diria para o maior desamor da sua vida (até agora)?
Eu não diria nada. Quero que essa pessoa esqueça que eu existo, até hoje tenho medo dela. Estou te falando isso rindo de nervoso, porque é uma pessoa até hoje bem problemática. Espero não encontrá-la mais ao vivo.

O que é imperdoável para você em qualquer relação?
Falta de confiança. Demoro a me abrir e, se quebram essa confiança, nem sempre consigo retomar e ficar 100% de boa. E isso não é só sobre traição conjugal, mas sobre confiança mesmo, vale para tudo.

De qual trabalho seu você mais se orgulha?
Não é um trabalho que envolve remuneração, mas me orgulho muito da mudança que meus pais tiveram. Eles tinham uma mentalidade e eu sempre fui muito de bater de frente, mas não só de responder, mas de argumentar. Sempre respeitei a hierarquia de casa, mas, hoje em dia, acho que eles têm a cabeça mais aberta e são mais felizes por isso. Têm mais senso crítico, são ótimas pessoas e parte disso foi um trabalho meu. Eles me fizeram acreditar que pessoas podem mudar.

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Qual a frase mais sábia que já te disseram?
“Pra que isso?” (risos). Meu avô me falava isso, pessoas desconhecidas também. Se eu reclamo que tô muito cansada, por exemplo, essa pode ser uma resposta que alguém daqui te dar. Isso me faz pensar: a partir do momento que alguém pergunta o por quê da sua reclamação, desse seu desgaste emocional, ou você pensa no seu objetivo final e se acalma ou vê que não tem porque fazer aquilo mesmo.

Qual seria o título da sua biografia?
Atualmente, acho que seria “Malfeitona”, com a letra desenhada, não uma fonte que já existe, e pequenininho embaixo: “darkzerah da bahia”.

E quem interpretaria você no cinema?
Rapaz… não faço ideia, sou ruim com nome de atores e atrizes. Teria que ser alguém com olhos bem grandes e olheiras. E, pelo amor de Deus, uma pessoa que não fosse do Sudeste que fez fonoaudiologia para falar com meu sotaque.

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Qual seria seu primeiro decreto como presidente da República?
Adequação de impostos sobre todos os produtos e serviços. Quem ganha mais, paga mais imposto. É muito injusto que alguém que ganhe R$ 50 mil por mês pagar o mesmo imposto no arroz do que alguém que ganha R$ 1 mil.

E, por último, quem você gostaria que respondesse esse questionário?
A chef Lili Almeida, minha querida amiga.

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5 (Arte/Redação)

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