“Você se considera uma pessoa famosa, Deia?”, pergunto, já no final da entrevista. “Nossa, não. Nem um pouco. Não mesmo. Nãããão”, ela responde, rindo na sequência. Uma risada que eu já estou acostumado a ouvir e que, quase sempre, me faz rir também. Deia Freitas e eu, ao contrário do que você deve estar pensando, não somos amigos de longa data e nem trocamos piadas e memes no WhatsApp, como manda a boa amizade contemporânea. Eu sou, na verdade, apenas um dos 600 mil de ouvintes que, quase diariamente, apertam play para ouvir uma das histórias deliciosas que Deia tem para contar no canal Não Inviabilize, que pode ser acessado gratuitamente em todas as plataformas de streaming.
Histórias essas que vêm de todo canto do Brasil e são enviadas por sua audiência fiel. Digo isso porque, além dos números expressivos que fazem do Não Inviabilize o maior podcast independente do país – ele só fica atrás do Mano a Mano, uma produção Spotify com ninguém menos que Mano Brown –, a comunidade que ouve e apoia o podcast é também responsável por manter a engrenagem girando. Atualmente, são quase 20 mil assinantes, que contribuem mensalmente com R$ 10 na plataforma Apoia.se para que Deia e sua equipe de 12 pessoas continue produzindo o entretenimento que a gente adora. Como contrapartida, essa base de fãs e contribuintes têm acesso a histórias exclusivas, que só depois vão para os canais gratuitos.
Outra vantagem dos assinantes é poder ouvir as histórias no aplicativo do Não Inviabilize, uma das mais recentes novidades. “Em breve, quem não paga vai poder ouvir pelo aplicativo também. Quero conseguir deixar tudo lá. As histórias gratuitas estarão lá pelos links, assim não perco as métricas e continuo nos rankings”, Deia explica. Criado do zero, o app foi feito já pensado em código aberto. Ou seja: se os planos de Deia e dos desenvolvedores derem certo, o aplicativo será um serviço que qualquer podcaster poderá contratar para não depender dos streamings.
Como tudo começou
O fenômeno Não Inviabilize não teve início do jeito que conhecemos. A paixão por contar histórias foi algo que teve início na adolescência, quando Deia, aos 15 anos, trabalhava em uma agência de publicidade em Santo André, sua cidade natal, fazendo classificados. “Eu era a única que digitava e os anúncios eram diversos: venda de automóvel, obituário, gente procurando um amor. Pensa que era há 31 anos, não tinha internet, era tudo mato real!”
Daí para frente, contar histórias tornou-se um hobby que ela colocava em prática no blog Não Inviabilize – o precursor do podcast – e também em sua página do Twitter. Sair do texto e migrar para o áudio, a decisão de milhões, só veio por insistência externa. “Foi uma amiga, a Priscila Armani, que também é podcaster, que me convenceu. Eu não tinha interesse e não sabia como funcionava, mas ela falou tanto que eu fiz um canal no Telegram para contar histórias pelos áudios. Fiquei um ano fazendo isso e, um pouco antes de a pandemia começar, tomei coragem e fiz um podcast”, Deia lembra.
E, antes de estourar, foi necessário resiliência para ver a luz no fim do túnel. Com dois episódios publicados, a pandemia de covid-19 estourou, Deia estava desempregada e sem grana extra para seguir gravando em estúdio. O jeito foi continuar acreditando na contação de histórias e gravando de seu quarto, dentro de uma caixa de papelão. “Que, por acaso, é a caixa que eu uso até hoje. Já comprei uma cabine, mas ainda não chegou. É um perrengue e eu podia ter melhorado nesse tempo todo? Podia, mas já tá tudo ajeitadinho…”, ela completa.
E é sem mexer em time que está ganhando que Deia mostra que, sim, esse ditado tem seu valor. Além dos números expressivos e parcerias comerciais com clientes como Netflix e Johnson&Johnson, o Não Inviabilize está prestes a se tornar um produto transmídia. Ainda este ano, chegam às prateleiras os livros Picolé de Limão e Luz Acesa, coletâneas em texto das melhores histórias desses dois quadros do canal – que falam sobre perrengues, quase sempre em relacionamentos, e histórias sobrenaturais de dar arrepio, respectivamente. Outra novidade é que já está em produção, em parceria com a produtora de vídeo Fábrica, a série do Picolé de Limão, com estreia prevista para 2023 se tudo correr conforme o cronograma. Como inclusão também é papo sério para Deia, todas as 400 histórias já gravadas vão ganhar versões em libras, disponíveis no aplicativo.
A cereja do bolo? Um novo quadro para o canal que terá importância histórica. “Vamos contar as histórias de pessoas que foram impactadas positivamente pelos programas sociais do governo Lula. É um trabalho que quero fazer voluntariamente para, no final, trazer o Lula e perguntar se aquele programa social vai voltar, que alternativas as pessoas vão ter, até para termos algo para cobrar quando ele for eleito.” Outra novidade é que, nesta terça-feira, 5, Deia estreia também no Indiscutível, podcast em que discute notícias engraçadas e inacreditáveis ao lado de Camila Fremder. Falamos sobre tudo isso – e sobre a trajetória dessa gigante da podosfera – no papo a seguir: