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Elas fazem quadrinhos

Gabriela Borges, criadora da Mina de HQ, fala sobre representatividade feminina nesse mercado e indica 10 mulheres que arrasam nos quadrinhos

por Alexandre Makhlouf Atualizado em 31 ago 2021, 14h38 - Publicado em 31 ago 2021 00h17
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(Clube Lambada/Ilustração)

ocê lembra como aprendeu a gostar de ler? Eu me lembro: foi devorando gibis e almanacões da Turma da Mônica, que chegavam semanalmente na minha casa graças a uma assinatura que ganhei de aniversário da minha madrinha. A cada pacote com novas leituras, vários universos se acendiam e se criavam na minha cabeça. O gosto pela leitura virou gosto pela escrita e… bom, estamos aqui hoje, virei jornalista e só percebi recentemente o quanto devo isso aos quadrinhos. Fato é que, durante a adolescência, me distanciei dessa linguagem tão rica que são as HQs. Perdi o interesse e só recentemente, entrando em contato com outras questões como representatividade, gênero e narrativas dentro do mercado em que eu existo enquanto profissional, voltei a olhar para os quadrinhos.

É bem comum que a gente associe esse tipo de produção ao universo fantástico, de super-heróis que usam capas, combatem crimes e, claro, quase sempre são homens – héteros, brancos, musculosos. Isso só significa que vivemos em uma sociedade que é, no mundo todo, machista – de forma alguma isso prova que não existem mulheres produzindo ótimos quadrinhos. “Essa hegemonia masculina é muito grave e impacta, obviamente, nas escolhas que são feitas para o mercado em si. Eu bato muito na tecla de representação – o que a gente vê, o que está representado. Temos mulheres nas histórias em quadrinhos, mas como isso acontece? Como elas aparecem nas HQs? Para falar sobre esse “como”, falamos de representatividade – quem está por trás produzindo, e isso vai dos cargos de liderança e decisão até os cargos de produção. Quando isso muda, passos são dados para que os cargos de produção, execução e tudo mais também mudem. Mais diversidade nos cargos mais altos significa uma preocupação maior com mais diversidade nos mais baixos também. E é assim que a mudança acontece. Políticas afirmativas devem existir, é reparação histórica”, pontua Gabriela Borges, jornalista e criadora da Mina de HQ, projeto que existe desde 2015 e contribui para deixar o universo dos quadrinhos mais igualitário, dando protagonismo para mulheres e pessoas não binárias que produzem quadrinhos.

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“Temos mulheres nas histórias em quadrinhos, mas como isso acontece? Como elas aparecem nas HQs? Para falar sobre esse ‘como’, falamos de representatividade – quem está por trás produzindo, e isso vai dos cargos de liderança e decisão até os cargos de produção”

Gabriela Borges

Gabriela, assim como eu, também foi introduzida no mundo dos quadrinhos graças à Mônica, ao Cebolinha e ao Mauricio de Sousa. Mas ela nunca deixou o amor pelas HQs de lado. O gênero, inclusive, foi tema de sua pesquisa de mestrado: a representação da mulher e os discursos de gênero nas histórias em quadrinhos. O curso foi concluído em meados de 2013, na Argentina, e a levou a participar de diversos painéis e eventos sobre o tema – mostrando que, desde sempre, tinha muita mina fazendo HQ –, além de escrever uma coluna na revista Tpm sobre mulheres e o universo dos quadrinhos. Foi só dois anos mais tarde que o Mina de HQ como conhecemos hoje tomou forma e ganhou as redes sociais. Desde então, além de um perfil no Instagram, ele também virou site, com publicações inéditas mensais de quadrinistas mulheres, duas revistas impressas – você ainda pode contribuir com a segunda edição, hein? – newsletter, vídeos… “O maior desafio, sem dúvidas, é fazer de forma independente. O dinheiro vem todo de uma campanha de financiamento coletivo, apoio mensal e de algumas parcerias que faço, mas é totalmente independente. A contribuição de quem gosta desse trabalho é que faz acontecer. O Mina de HQ remunera todo mundo que faz trabalhos para a gente – e isso acontece com o dinheiro do Apoia.se. Eu, Gabriela, não ganho dinheiro, porque priorizei pagar as artistas, mesmo que seja só simbólico”, ela conta.

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(Colagem/Ilustração)

Mulheres, jornalismo e quadrinhos

Além das produções literárias nesse formato, com histórias de ficção capazes de fazer nossa cabeça viajar, a mistura de jornalismo e quadrinhos é algo em que Gabriela defende muito e explora com maestria na Mina de HQ. Ela defende que a vertente é muito acessível, principalmente quando falamos de temas mais densos, e permite que o jornalista se expresse de uma maneira diferente, às vezes com mais detalhes gráficos e pontos de vista que contribuam para a história e a notícia. “Os veículos de comunicação deveriam investir muito mais nisso, acho que ainda existe muito preconceito em ver HQ como uma linguagem menor, infelizmente. Mas o poder de alcançar pessoas que as HQs têm é muito grande.” Mas, quando unimos essas duas discussões – quadrinhos e representatividade feminina –, a verdade é que o espaço fica ainda menor para que elas brilhem tudo que têm para brilhar.

Capa da segunda edição da revista Mina de HQ, organizada por Gabriela Borges.
Capa da segunda edição da revista Mina de HQ, organizada por Gabriela Borges. (Ilustrações de Carol Ito/Divulgação)

Sabemos que a diversidade é boa para todo mundo e que precisamos pensá-la de forma mais ampla. Isso porque, quanto mais gente diferente, com histórias diferentes e bagagens diversas e complexas, mais rico o conteúdo fica – independentemente do formato. No universo das HQs, cada vez mais temos ouvido sobre gigantes como a Marvel e a DC propondo novos jeitos de desenhar corpos femininos, de forma menos sexualizada, e até revelando mais sobre a sexualidade de seus super-heróis. “O problema não é só sexualizar os corpos femininos, mas como isso é feito, por quem isso é feito e com qual objetivo. Mostrar corpos diferentes, histórias diferentes, raças, linguagem, lugares diferentes. Tem tantas coisas, é tão interseccional… E as mulheres, principalmente as que estão dentro da luta feminista, trazem essa preocupação com a pluralidade”, pontua Gabriela.

“O problema não é só sexualizar os corpos femininos, mas como isso é feito, por quem isso é feito e com qual objetivo. Mostrar corpos diferentes, histórias diferentes, raças, linguagem, lugares diferentes. E as mulheres, principalmente as que estão dentro da luta feminista, trazem essa preocupação com a pluralidade”

Gabriela Borges
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E público para isso, a gente sabe, já existe. A história de Luiza de Souza, a Ilustralu, quadrinista jovem do Rio Grande do Norte, não nos deixa mentir. Ela publicou Arlindo, seu primeiro livro de HQ, que conta a história de um garoto nordestino gay, pelo selo Seguinte da Cia das Letras. Mas seu trabalho começou muito antes de uma editora se interessar em comprá-lo. Luiza construiu a história de Arlindo na internet, como webcomics, e angariou uma legião de fãs fiéis, que desembolsaram quase R$ 450 mil no financiamento coletivo para que o livro existisse. Cifras desse tamanho para o mercado editorial, se você não faz parte dele, são imensas.

Por isso, conversamos com Gabriela e listamos, abaixo, dez mulheres que mandam bem nos quadrinhos e merecem entrar para a sua biblioteca. Vale para nós e vale para todo mundo que for ler: depende também de quem lê deixar o cenário da literatura mais diverso.

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(Colagem/Redação)
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Marília Marz

A paulista é autora do livro Indivisível, que conta a história do bairro da Liberdade. Chargista da Folha de S. Paulo

Helô D’Angelo

Também de São Paulo, é autora dos livros Dora e a Gata e Isolamento, além de ser capista do Mamilos Podcast e chargista no Brasil de Fato.

Ellie Irineu

Ela é do Mato Grosso do Sul e atua como organizadora da série Histórias Quentinhas, com dois livros sobre pessoas LGBTQIA+, e co-organizadora do livro Quadrinhos Queer

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Diana Salu

Essa quadrinista de Brasília é autora de Cartas para ninguém e Então você quer escrever personagens trans?.

Luiza de Souza (Ilustralu)

Contamos um pedaço da história da Ilustralu lá em cima. Ela é do Rio Grande do Norte e autora de Arlindo.

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Germana Viana

A pernambucana é autora de As Empoderadas e Lizzie Bordello e as Piratas do Espaço, além de ser organizadora da série Gibi de Menininha. Também desenha e escreve para o gibi trimestral MENAGE, com historinhas +18.

Bianca Pinheiro

Do Rio de Janeiro, a quadrinista é autora de Bear, Alho Poró, Eles Estão Por Aí – vencedor do Troféu APCA 2018 na categoria quadrinhos – e Mônica: ela mesma, a personagem icônica de Mauricio de Sousa.

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Sirlanney

Cearense e autora de Magra de Ruim, série de quadrinhos criada em 2011 que se transformou em livro homônimo, lançado independentemente por meio de uma campanha de financiamento coletivo em 2014, com 2ª edição em 2016, pela editora Lote 42.

Verônica Berta

A paulistana assina a HQ Ânsia Eterna, finalista do Prêmio Jabuti, e professora da Quanta Academia de Artes, em São Paulo.

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Helô Rodrigues

Essa quadrinista paraense é dona de tirinhas incríveis – dá até para encomendar a sua 😉 – e transmite boa parte de seu trabalho e de seu processo criativo nas redes sociais.

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