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Alanis Guillen é a voz da nova geração

Conversamos com a atriz sobre a vivência no Pantanal, a personagem Juma, sua relação com o feminismo e mais

por Beatriz Lourenço Atualizado em 23 ago 2022, 14h47 - Publicado em 22 ago 2022 06h00
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(Arte/Redação)

 onça é um animal astuto que protege o que é seu e se impõe diante das dificuldades. Não à toa é o bicho que Juma Marruá, protagonista da novela Pantanal, se transforma quando precisa ser instintiva e lutar pelo que quer. A personagem, interpretada por Alanis Guillen, tem dado destaque à atriz de 24 anos – que mostrou que tem talento de sobra para assumir o horário nobre. 

“Para entrar nesse universo, fui para o lugar de uma mulher intuitiva e que respeita muito o que seu corpo precisa e deseja. Ela tem me ensinado a estar em maior contato comigo e assumir minha própria voz”, revela Alanis à Elástica. 

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Na narrativa, é fato que ela sabe se posicionar: quando não quer algo, Juma diz sem rodeios ou medo de decepcionar alguém – virou até meme de tanto falar “querimbóra”. Segundo Alanis, é possível pensar suas atitudes a partir de uma perspectiva feminista, já que as mulheres foram ensinadas socialmente a pensarem antes nos outros e depois em si. “O feminismo nos ajuda a trabalhar a apropriação do nosso corpo porque até então ele não é nosso, está sempre vulnerável às decisões de outros”, diz. 

Para ela, a imersão no Pantanal foi uma experiência transformadora: abriu os olhos para as questões ambientais, viveu momentos de enfrentamento de si e mudou a alimentação para adaptar o corpo ao novo ambiente. “Viver lá é totalmente diferente do que eu achava que era. Algumas coisas que vi de perto eliminaram o lado que romantizava a natureza e me fizeram entender que a luta pelo meio ambiente é urgente”, alerta. “Lá as emoções ficam mais latentes porque ao ver aquela imensidão toda, você entra num estado de graça muito maravilhoso.” 

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(Alanis Guillen/Divulgação)


“Viver lá [no Pantanal] é totalmente diferente do que eu achava. Algumas coisas que vi de perto eliminaram o lado que romantizava a natureza e me fizeram entender que a luta pelo meio ambiente é urgente”

O ascendente em gêmeos faz Alanis acreditar que tudo é possível, seja o sucesso entre a nova geração ou um mundo com mais amor e empatia. “Experimentação” é sua palavra-chave e o que a guia durante os novos desafios. “Experimentar a si, a vida e o que há de bom e ruim no mundo é essencial para formar um bom aprendizado”, comenta. Aqui, você lê o papo completo com Alanis Guillen:

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Como foi o preparo para viver a Juma? O que tem dela na Alanis e o que Juma tem aprendido com você?
A Juma é destemida e, para entrar no universo dela, fui para esse lugar de uma mulher intuitiva, instintiva e que respeita muito o que seu corpo precisa e deseja. Foi um encontro muito incrível. Ela tem me ensinado a estar em maior contato comigo e assumir minha própria voz. Juma é uma personagem que evoca esse lado corajoso de um bicho que enfrenta o mundo todo.

Quando Juma não quer ou não gosta de algo, ela fala sem rodeios e não espera agradar o outro. Quando uma mulher é fiel aos seus desejos dessa forma, tem a ver com olhar o mundo a partir de uma perspectiva feminista?
O feminismo nos faz relembrar dos nossos direitos e nos firma no nosso corpo. Também nos ajuda a trabalhar a apropriação porque até então o nosso corpo não é nosso, ele está sempre vulnerável às decisões de outros. Percebemos isso até pelas leis, já que não podemos decidir o que queremos fazer sobre nós mesmas. A Juma vem nesse lugar que luta pelo que somos e pelo que queremos e não queremos.

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(Alanis Guillen/Divulgação)

Qual é a sua relação com o feminismo?
É uma prática diária de elaboração de direitos. Nós fomos treinadas, socializadas e domesticadas a servir. Também precisamos estar sempre nos padrões impostos pelos outros. Vivo um exercício de estar consciente do que eu quero e posso realmente. Também gosto muito de compartilhar experiências e diálogos com outras mulheres porque é assim que percebemos que o que foi normalizado na sociedade é um grande absurdo. 


“O feminismo, para mim, é uma prática diária de elaboração de direitos. Nós fomos treinadas, socializadas e domesticadas a servir. Vivo um exercício de estar consciente do que eu quero e posso realmente”

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O que você leva de aprendizado não só dela, mas de toda a vivência no Pantanal?
Essa experiência está sendo transformadora em todos os âmbitos: profissional, espiritual e pessoal. É uma grande imersão! O dia a dia é intenso e as questões da natureza estão cada vez mais fortes em mim. No Pantanal, vivi situações que me fizeram entender os limites do meu corpo e prestar atenção em quem eu sou. 

Precisamos saber pisar nessa terra-mãe porque ela grita muito forte a importância que tem para o planeta. Durante esse tempo lá, entendemos que temos que viver o ritmo daquele lugar, e não impor nosso. Ficamos um ano envolvidos com esse projeto e, apesar da rotina ser muito exaustiva, estou me deliciando e sentindo tesão nesse caos. 

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Durante as gravações, você denunciou queimadas na região. Além disso, tem apoiado o projeto SOS Pantanal. De que forma viver na região te abriu os olhos para as questões ambientais?
O Pantanal é totalmente diferente do que eu achava que era quando fui pela primeira vez. Viver lá nos aproxima muito das questões ambientais. Há muitas queimadas que prejudicam o lugar. Na temporada de cheia, por exemplo, o rio estava mais seco do que a temporada de seca que vimos no ano passado. Aí percebemos de perto as consequências do desmatamento e o descaso das nossas leis de proteção ambiental. 

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Vi bichos migrando e morrendo no caminho em busca de água, jacaré perdido no meio da seca para tentar encontrar o rio e os bichos se devorando por falta de peixe. Isso eliminou aquele meu lado que romantizava a natureza e me colocou em um lugar de entender que essa é uma luta que temos que travar para ontem. Precisamos pressionar o governo e nos juntar a projetos que querem leis para não permitir mais atrocidades e barbáries.

Na época da estreia da novela, você contou que voltou a comer carne depois de anos. Qual é a importância de falar sobre a diminuição do consumo e, mais, de não pegar tão pesado consigo mesmo e poder ir e voltar nessas decisões sem abrir mão de um ideal maior?
Essa foi uma decisão consciente. É um momento que estou vivendo. Precisei experimentar meu corpo dessa forma e isso é algo que pode mudar de novo ao longo da minha trajetória. Não precisamos nos colocar metas para a vida toda. No começo do ano, eu estava numa pegada ayurveda muito forte, mas lá no Pantanal a gente tem que lidar com o que tem ali. Como trabalho muito na rua, não dá tempo de preparar minha própria comida. E o legal do ser humano é essa capacidade de se adaptar aos novos hábitos, sejam eles alimentares ou não. 

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(Alanis Guillen/Divulgação)

Como é sua relação com o próprio corpo e autoestima?
Isso é algo que varia, depende do dia! A Juma personagem me trouxe para um lugar de mais vaidade. Às vezes, me sinto meio Vênus e gosto de me namorar. Juma fez eu me olhar com mais carinho e me sentir bonita do jeito que sou. Vira e mexe, quando saio do banho molhada, me olho no espelho e falo “UAU!”. Está claro para mim que nossa autoestima tem a ver com estar confortável com o próprio corpo, não com padrões estéticos.

A Juma é uma personagem que já teve diversas cenas de nudez – e uma vertente feminista afirma que, ainda que a nudez possa empoderar, acaba sendo mais um mecanismo de dominação do patriarcado. Como enxerga essa questão?
Eu, Alanis, acho a nudez a coisa mais linda, pura e potente. Tem esse lugar no imaginário que a nudez é sensualizar e provocar. Mas a partir do momento que entendi que a minha sensualidade, sexualidade e libido é um potencializador criativo, minha visão mudou. A libido não é só algo sexual, mas também sentir brilho e vontade de viver e experimentar a vida. Não interessa como o outro me vê, mas como eu me sinto. 

Ainda assim, esse é um assunto delicado porque vivemos numa estrutura que sempre vai colocar a mulher no lugar de objeto e de domínio do homem. E o que a gente faz com isso?

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“A libido não é só algo sexual, mas também sentir brilho e vontade de viver e experimentar a vida. Não interessa como o outro me vê, mas como eu me sinto”  

Sua primeira novela foi Malhação, ainda em 2019. Três anos depois, você já chega protagonizando um remake esperadíssimo, com cenas difíceis de sexo e nu. Como você se preparou para receber toda essa atenção?
Tento ter controle das coisas mas, quanto mais eu tento, mais percebo que não tenho controle de nada. Estudei muito, me informei e me coloquei em contato com a natureza – saindo um pouco do meu apartamento em São Paulo. Nesses casos, acho que a vida é o que nos prepara. Ainda assim, faço terapia e tento entender como os artistas que eu admiro lidam com toda essa exposição.

De segunda à sábado, a gente trabalha muito e, às vezes, até de domingo. Para desopilar, gosto de conversar com amigos, ouvir um som bom para dançar e dar um mergulho no mar. 

Você comentou que tem sexualidade fluida e que se apaixona a partir de uma conexão, não necessariamente por um gênero. Qual é a importância de falar sobre isso de ter mais atores LGBTQIA+ nas telas?
Assumir isso é uma libertação: passamos a viver com mais facilidade e com relações mais sinceras. O amor também parece mais sincero e real. Falar sobre isso e se aceitar faz com que a gente consiga olhar o outro com empatia. E nós, atores, que estamos na mídia, podemos ajudar a fortalecer o espectador que nos assiste e dizer para ele que amar uma pessoa fora do espectro heteronormativo não é errado. Não somos uma coisa só! E que bom que podemos amar de diversas formas.

O que temos visto de bastidores é que a equipe toda se deu bem e se ajudou durante as gravações. Quais são os momentos mais memoráveis que você guarda e as amizades que você vai levar para a vida?
As viagens pelo Pantanal foram sensacionais porque foi um convívio intenso entre a equipe inteira. Lá, as emoções ficam mais latentes, porque você vê aquela imensidão toda e entra num estado de graça muito maravilhoso. Há um contato consigo muito profundo porque o silêncio também é diferente. 

Todos viveram momentos de enfrentamento de si porque foi um trabalho quase que de devoção. O apoio, o aprendizado e os abraços que demos quando havia momentos difíceis serão eternos. 

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(Alanis Guillen/Divulgação)


“Nós, atores, que estamos na mídia, podemos ajudar a fortalecer o espectador que nos assiste e dizer para ele que amar uma pessoa fora do espectro heteronormativo não é errado. Não somos uma coisa só! E que bom que podemos amar de diversas formas”

Você tem se posicionado nas redes sobre política e questões sociais. De que forma esse pode ser um meio de denúncia e diálogo? Quais são as pautas que você acha que devem estar no centro do debate público hoje?
Estamos nas redes sociais o tempo todo e a informação se espalha muito rápido. É uma ferramenta que estou tentando aprender a usar cada vez mais para comunicar de uma forma sábia e com propósito. A política é o cerne de tudo, vejo como é importante falar sobre isso e se posicionar para mudar o que não vai bem. 

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A eleição deste ano vai ser decisiva e é o que vai pautar o caminho da cultura, do meio ambiente e as questões dos povos indígenas. Eles, inclusive, são quem temos que ouvir mais – seu conhecimento sobre a terra e o ser humano é que pode nos ajudar a sair dessa crise climática e de saúde.

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