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“Vale Night” conscientiza através do riso

Assistimos o longa-metragem, que estreia nesta quinta-feira, 17, conversamos com o elenco e contamos aqui nossas impressões

por Beatriz Lourenço 17 mar 2022 01h50
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(Clube Lambada/Ilustração)

ansada de lidar com as responsabilidades do primeiro filho, Daiana resolve deixar o bebê com o pai para descansar e sair com as amigas. Vini, um jovem desligado que também está entediado, decide levá-lo para o baile funk, onde tudo vai bem até que ele perde o menino e parte em busca da criança por toda a comunidade, se colocando em situações inusitadas para que sua namorada não perceba nada. 

Esse é o enredo do filme nacional Vale Night, dirigido por Luis Pinheiro, que estreia hoje nos cinemas. Além do elenco, que conta com nomes como Linn da Quebrada, Pedro Ottoni, Gabriela Dias, Yuri Marçal e Jonathan Haagensen, o que chama atenção é a abordagem de inúmeros assuntos sérios que pretendem conscientizar o espectador a partir do riso. 

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A evasão de meninas da escola em razão da gravidez na adolescência é o que está no centro do roteiro. Sabe-se que, no Brasil, o índice chega a 18% e é o maior obstáculo para a conclusão da educação formal entre elas. Segundo a produtora Justine Otondo, a cultura pode ser um meio de reverter esse cenário. “As adolescentes dificilmente irão ver um documentário sisudo sobre o tema. O nosso diferencial é que criamos uma história onde elas se enxergam e se colocam no lugar dos personagens. Acredito que a leveza abre um portal para a reflexão”, conta. 

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“As adolescentes dificilmente vão ver um documentário sisudo sobre o tema. Nosso diferencial é criar uma história em que elas se enxergam, se colocam no lugar dos personagens. A leveza abre um portal para a reflexão”

Justine Otondo

A necessidade da rede de apoio quando isso acontece também é um tema que entra em pauta já que, quando uma mulher tem filhos, sua carga mental e de trabalho dobra. Nesse sentido, Daiana tem a mãe e a avó como referência de mulheres batalhadoras que estão ao seu lado. Gabriela Dias, que dá vida à protagonista, comenta que ter essas pessoas por perto é extremamente necessário para que as mães consigam realizar tarefas básicas, como comer, cuidar de si e trabalhar. “As crianças precisam da mãe o tempo todo. Na amamentação, mais ainda”, diz. “O cotidiano deve ser dividido com os companheiros, senão a chance dela ficar sobrecarregada é muito alta.”

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(Vale Night/Divulgação)

Outra peça central na vida de Daiana é seu irmão Anderson, um homem machão que ameaça Vini o tempo todo para que ele passe a ser proativo e cuide da família. O arco do personagem acontece quando ele toma uma droga desconhecida e passa a curtir a balada: dança, tira a camisa e se solta – algo que nunca havia feito antes. Segundo o ator Jonathan Haagensen, esse é um gancho para pensarmos sobre a masculinidade tóxica: “Ele é obrigado a performar esse macho alfa violento como uma forma de preservar a família. Mas é muito importante ver sua felicidade quando consegue se despreocupar e entrar em contato com seu lado feminino.”

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A escolha da favela como o cenário da comédia pode ser vista como uma mudança de curso na representação das periferias. Isso porque, até então, o local era limitado a narrativas de conflitos, drama e ações policiais. O elenco, majoritariamente negro, mostra que o tom das produções muda quando finalmente assumem o controle do que querem contar. “Estamos passando por um movimento muito forte não só de representatividade, mas de ocupar espaços diversos. O cinema é um mercado de difícil acesso e, por muito tempo, as pessoas da área olhavam para os nossos corpos de maneira objetificada”, declara Jonathan. “Vale Night é único na maneira de levar luz à problemática de maneira honesta e positiva. Ter um herói preto que vive uma comédia romântica é essencial para estampar nas telas que a gente se ama, produz cultura, gosta de moda…”

“Vale Night é único na escolha da favela como o cenário da comédia. Ter um herói preto que vive uma comédia romântica é essencial para estampar nas telas que a gente se ama, produz cultura, gosta de moda”

Jonathan Haagensen

Lina – nossa musa do Big Brother Brasil 2022 – interpreta Puga, uma DJ extrovertida e a melhor amiga de Vini. [Atenção: spoiler depois dessa frase!] Na última cena, ela nos surpreende ao aparecer grávida. Afinal, por que Puga, tão focada na carreira, teria se descuidado? Bom, o diretor explica que esse foi um pedido da própria artista! “Ela disse que sempre sonhou estar grávida e acatamos essa sugestão”, conta. “Isso passa um lugar de escuta das subjetividades de um elenco tão politizado e que teve seu corpo atravessado por diversas coisas que nós, enquanto brancos privilegiados, não tivemos. É por isso que sinto que, a partir desse filme, conseguimos participar da revolução da inclusão.”

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(Vale Night/Divulgação)
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Durante a entrevista, é claro que não deixamos de fazer a pergunta mais importante: Como vocês gastariam um vale night?

Pedro Ottoni: “Eu não sou pai, então não imagino que seria descansando. Vendo de fora, acho que a paternidade e a maternidade são muito ingratos porque as pessoas acham que você não pode reclamar do tanto de trabalho que tem. Mas isso, na verdade, não é desamor pela criança.” 

“É igual aquele trabalho que você ama! Eu amo ser ator, mas tem dias que são exaustivos e eu penso ‘eu só não queria estar em um set de gravação’. Nesse sentido, acho que o pai e a mãe também precisam ter um momento de lazer sozinhos para não esquecerem sua singularidade.”

Gabriela Dias: “Ontem tive um vale night maravilhoso! Eu fui à praia. Então, seria exatamente assim: dormir, descansar e curtir o mar.” 

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Justine Otondo: “Eu tenho três filhos! Meu vale night acaba acontecendo quando eu estou trabalhando e preciso ir gravar.” 

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