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Racismo em tempos ultraliberais

Autor das ideias mais contundentes sobre branquitude na atualidade, Lourenço Cardoso propõe novos paradigmas para uma época sombria

por Artur Tavares Atualizado em 20 jul 2021, 16h51 - Publicado em 5 jul 2021 23h15
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(Arte/Redação)

ra 2018, a poucos dias da eleição de Jair Bolsonaro à presidência do Brasil, quando Angela Davis cravou em uma entrevista ao jornal El País: “O racismo voltou a ser mais violento e explícito.” Embora ela não se dirigisse exatamente às nossas terras tupiniquins, seu discurso serviu como prelúdio e alerta para todos nós. Observando a ascensão de uma nova extrema direita em seu país de origem, Estados Unidos, e em outros lugares do mundo, a filósofa foi categórica em associar as questões raciais ao neoliberalismo.

São nos períodos em que o poder econômico fala mais alto que a máquina de moer carne do capitalismo atua de forma mais implacável. As vidas negras importam para o sistema, é verdade, mas como engrenagens descartáveis de um motor econômico que não desliga. De resto, ficam à margem, desassistidas pelo Estado: sem educação, saúde, saneamento básico, sem dignidade, afinal.

Historiador e pesquisador da Unilab,mestre pela Universidade de Coimbra (Portugal) e doutor pela Unesp, Lourenço Cardoso está há 15 anos se debruçando sobre as questões sociais geradas pela branquitude: apropriação intelectual e cultural, hegemonia econômica, manutenção do racismo estrutural. Os debates que ele propõe têm pautado e modernizado às discussões sobre raça no Brasil. Desde 2007, ele denuncia os perigos de uma branquitude acrítica: aquela que não apenas não se importa com o racismo, como também não evita fomentar a discriminação sob a certeza da impunidade; ao mesmo tempo que também faz pontuações sobre a branquitude crítica: aquela que percebe o racismo mas, mesmo aliando-se à causa antirracista, ainda não consegue quebrar as estruturas de poder.

Lourenço, autor do recente livro O branco ante a rebeldia do desejo: Um estudo sobre o pesquisador branco que possui o negro como objeto científico tradicional, é dono de ideias contundentes, as quais ele apresenta sem verniz em longas conversas e em seus escritos. Nessa conversa com Elástica, ele explica suas teorias e faz uma análise da atual situação brasileira.

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(Lourenço Cardoso / editora Appris/Divulgação)

Até meados do século passado, os estudos sociais e antropológicos colocavam o branco como “neutro”, e os estudiosos debruçavam suas pesquisas sobre o “outro”: o negro, o indígena, o amarelo. Em que contexto surgem os primeiros estudos sobre brancura e branquitude, e quais são os principais ganhos em colocar o branco no centro de análise?
Podemos dizer que Guerreiro Ramos é o precursor nos anos 1950. Não se trata de uma ação individual. Ele é produto de sua discussão com o movimento negro daquela época. Outros intelectuais negros debateram tal questão, caso de Fernando Góes e Abdias Nascimento, porém, Guerreiro Ramos é aquele que trata do tema de forma mais expressiva no seu artigo, Patologia Social do “Branco” Brasileiro, publicado em 1957. Há intelectuais estrangeiros que poderia citar como Frantz Fanon, Du Bois, contudo, Guerreiros é o pioneiro de maior destaque no mundo. Isto minhas fontes têm mostrado. Um intelectual negro, baiano é aquele que primeiro coloca essa questão de forma muito intensa para sociedade global.

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Por causa do “complexo de vira-lata” da academia brasileira, vamos demorar ainda para admitir essa sua contribuição. Especialmente, ao pensar nos acadêmicos brancos que valorizam os estrangeiros em detrimento aos nacionais em regra, por isso “complexo de vira-lata”. Quanto aos ganhos dessa análise? Diria que, um aspecto já foi respondido pelo próprio Guerreiro Ramos, quando disse que “o pesquisador branco possui a vantagem/privilégio de pesquisar todos os outros não-brancos, sem por esses serem investigados”. Isto é, analisados, problematizados. A produção de conhecimento sobre o não-branco é uma vantagem que branco acadêmico possui. Ele passa a saber sobre o outro, o negro, o “indígena” e oculta sobre si. Diante desse ato de se esconder, o branco persiste com suas vantagens por ser branco, vantagens raciais, sem questionamentos. O que não é visibilizado possui maiores possibilidades de não ser problematizado.

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(Arte/Redação)

Gilberto Freyre, Florestan Fernandes, Lilia Schwarcz… não são poucos os autores brancos que se debruçam sobre as questões raciais brasileiras. Em seu livro mais recente, O branco ante a rebeldia do desejo: um estudo sobre a branquitude no Brasil, você aborda como os brancos tomaram para si o privilégio dos estudos sobre os negros. Até onde essas teorias chegaram, e o que elas falharam em apresentar para a Academia?
A produção científica é publicada para ser criticada pela comunidade científica e de fora da academia. Ela possui sua história, incompletude, limitações. Nisto se encontram todos os cientistas brancos, brancas, negros, negras e todos os outros. Particularmente, cabe mencionar o valor que possui Florestan Fernandes, pois produziu uma obra valiosa, ele é um cientista branco de destaque merecido, no entanto, seu valor não é maior do que o do cientista negro Guerreiro Ramos, eles, inclusive, foram contemporâneos.

Não há problemas que o cientista branco estude o não-branco, o problema é que somente eles estudem, ou que eles possuam mais espaços nos ambientes acadêmicos e da mídia para expor os seus trabalhos. Outro ponto questionável é que eles desconsiderem os trabalhos dos cientistas negros por considerarem menor, fruto da mentalidade racista acadêmica. Para ser mais concreto, os cientistas brancos, que possuem o negro como objeto científico tradicional, têm sido criticados pelos youtubers negros e negras, o maior incômodo deles, no entanto, não advêm do fato de a crítica vir de um não acadêmico, e sim, de partir do negro e da negra, para eles, seres inferiores. Diante disso, vão procurar apoio em outros cientistas brancos, e alguns poucos cientistas negros e negras, para se esquivarem das críticas dos youtubers a partir do argumento falso de que alguns querem silenciá-los. Porém, a comunidade negra nunca teve poder para silenciar os brancos no Brasil em nenhum momento da História.

Um ponto que os estudos da branquitude apontam também sobre a produção científica branca é aquilo que já mencionei, o branco investiga o não-branco e não pensa em si, porque o “problema”, o “desvio do padrão”, seria não ser branco, o problema é não ser branco. Logo, o trabalho da produção científica é uma epistemologia sobre o negro que não necessariamente problematiza as vantagens dos brancos. Essa é a tendência que os trabalhos sobre branquitude apontam. Porém, quanto às falhas, tudo na produção científica é passível de falha, tanto a produção antiga quanto a recente, e a respeito de todos os temas.

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Raça

É possível que essa condição do branco estudando o negro e o racismo tenham perpetuado a ideia de que o racismo tem a ver exclusivamente com preconceito a um tom de pele, em vez de abordar a fundo questões socioeconômicas e culturais históricas?
A produção científica sobre o negro, a epistemologia negra, tratou de todos esses temas citados de forma profunda, poderia citar por exemplo, os trabalhos do sociólogo negro Clóvis Moura, seria muito bom conhecê-los. O Brasil deveria conhecer mais os ativistas e os intelectuais da comunidade negra que possuem uma vasta produção. Havia uma lacuna de trabalhos sobre a branquitude brasileira. No entanto, já estamos preenchendo. O problema é a invisibilização dos cientistas negros. Por exemplo, são festejados os dicionários sobre o universo negro organizados por uma cientista branca, enquanto há o silenciamento ao dicionário sobre a escravidão produzido por Clóvis Moura. Nei Lopes escreveu muitos dicionários, muitos livros que ainda são poucos conhecidos. É evidente que no futuro uma grande editora brasileira vai republicar todas as suas publicações.

“São festejados os dicionários sobre o universo negro organizados por uma cientista branca, enquanto há o silenciamento ao dicionário sobre a escravidão produzido por Clóvis Moura”

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(Arte/Redação)

Por que não fazer isto agora? Aproveitar que temos ainda a honra de conviver com Nei Lopes, um dos maiores intelectuais vivos do mundo de todos os tempos. Um pensador negro e brasileiro. Façamos isso com a produção da escritora Esmeralda Ribeiro, façamos isso com a coletânea Cadernos Negros (CN), uma antologia negra que existe desde de 1978, que neste ano publicou o número 43, uma coletânea que existe há mais de 40 anos sem interrupções. Diante disso, o que fazemos? Se tivermos de comprar uma antologia de poesia negra, compramos de uma grande editora, organizada por uma cientista branca ou branco, e continuamos a ignorar os Cadernos Negros. Este é o ponto.

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Falando sobre isso, porque até hoje a maior parte da sociedade ainda vê racismo dessa forma, a exclusividade a um preconceito de tom de pele?
O fenótipo é o aspecto mais evidente do racismo no Brasil, por isso as pessoas enxergam assim. Também é o ponto que mais aparece nas mídias. Nem toda a produção acadêmica está popularizada. Os conceitos raça, racialismo, étnico-racial, racialismo antirracista, racismo sem raça, discriminação racial injusta, brancura, branquitude, negrura são termos mais utilizados na produção científica. E tudo possui história de usos e sentidos que obviamente mudam no decorrer do tempo. A sua pergunta também me sugere a discussão sobre a ideia de “marca” e de “origem” numa comparação entre a sociedade brasileira e a estadunidense.

Vamos por partes: nos Estados Unidos e no Brasil tanto a “origem” (a herança ancestral) e a “marca” (o “fenótipo”) são marcadores da diferença que atuam na concepção do que consideramos branco e negro. No entanto, Oracy Nogueira, na sua pesquisa intitulada Preconceito de marca, mostra que a “origem” era mais acentuada na sociedade estadunidense e a “marca” na sociedade brasileira. Isto na época em que ele pesquisou. Há pesquisas mais recentes que indicam que a “marca” tem se mostrado muito relevante nos Estados Unidos.

Étnico-racial

Quanto ao Brasil? Assim como a “marca”, a “origem” sempre foi significativa para hierarquização racial branco-negro. Contudo, de fato, podemos considerar que o fenótipo se mostra como o aspecto mais acentuado. Porém, a constatação de que o corpo é o elemento mais evidente não constitui que se trata do significado total. Nem a última palavra na discussão sobre a concepção do que é ser negro e ser branco nas sociedades racializadas do mundo. Em relação a ser branco no Brasil? Significa se considerar numa hierarquia superior ao negro brasileiro, e a todos os negros do mundo. Mesmo que ao visitar a Inglaterra, os Estados Unidos, a Alemanha o branco seja considerado menos branco ou até não-branco. Ser branco brasileiro é um branco que também deseja “embranquecer”, isto é, se tornar mais branco que seriam esses brancos dos países que citei.

Você fala sobre branquitude crítica e branquitude acrítica, em um sentido em que os brancos críticos à situação de racismo também não se livraram totalmente do racismo, enquanto mantêm estruturas de poder e ilhas de convívio social. Hoje se fala muito no conceito de “aliado”. Até onde esse “aliado” é útil? Ele pode ser apenas uma construção para a perpetuação dessas estruturas sociais?
Em resumo, o branco crítico é aquele que publicamente diz ser contra o racismo. No espaço privado pode ser diferente, logo, existe a possibilidade de hipocrisia. Todavia, na sua interação racial, defende o discurso que o racismo é no mínimo imoral, ilegal, maniqueistamente falando, coisa de gente má. Enfim, não concorda em público com a ideia e prática racista. Em relação ao branco acrítico, estou me referindo ao branco neonazista, neo-Klu Klux Klan, o branco ultradireitista.

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Elaborei esses conceitos em 2007. Naquele momento estava preocupado com a possível vitória de um político branco de ultradireita na Europa para assumir a chefia do poder executivo. Não imaginava a eleição de Trump e o cenário político no Brasil atual. Pretendo retomar essa análise em breve.

Quanto à questão dos aliados? Traduzindo, quanto ao branco que quer lutar contra o racismo? Esse seria o aliado? O que o impede? O impedimento seria a crítica do negro e da negra? Portanto, o branco deixaria de fazer uma coisa por causa da crítica da comunidade negra? A crítica negra possui o poder do branco deixar de fazer o que gostaria no Brasil? Historicamente, não. Na verdade, estamos de volta com a questão, crítica negra e incômodo branco ou branca. O suposto branco aliado na verdade não quer ser criticado pelos negros. Se possível, deseja ser elogiado. Qual a razão para o elogio? O branco quer ser elogiado por lutar contra a opressão? Ser elogiado por fazer o que é certo do ponto de vista ético, moral e legal.

Em suma, nada impede o branco de lutar contra o racismo praticado pelo seu grupo de pertença. A crítica negra nunca possuiu tal poder. O branco aliado não quer é ser criticado. E ele será criticado pelo negro e a negra quando considerarem que existe algo a criticar. É um absurdo o branco não querer ser criticado pelos não-brancos, todos não-brancos. Abreviando, é isso que esse branco aliado almeja. E se o branco aliado opta por não lutar contra o racismo ou qualquer outra forma de exploração/opressão será uma escolha sua, não daquele que o criticou. O aliado branco ao se incomodar com a crítica negra mostra que ele ainda persiste com a mentalidade colonial, ou seja, incomoda a crítica quando vem daquele que considera inferior. Se alguém tem que lhe criticar? Que seja o branco. Não cientistas negras, não yotubers negros. Ela branca ou ele branco somente vão aceitar a crítica do youtuber branco, assim se amargura menos.

“Nada impede o branco de lutar contra o racismo praticado pelo seu grupo de pertença. A crítica negra nunca possuiu tal poder. O branco aliado não quer é ser criticado. E ele será criticado pelo negro e a negra quando considerarem que existe algo a criticar. É um absurdo o branco não querer ser criticado pelos não-brancos, todos não-brancos”

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(Lourenço Cardoso/Divulgação)
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Desde a implantação das cotas raciais no Brasil, em 2003, parte da intelectualidade branca tomou para si o debate de que ações afirmativas como essas servem apenas para perpetuar o racismo, um debate que agora toma a mesma forma quando grandes empresas, como a Basf e o Magazine Luiza, anunciam programas de trainee e contratação exclusivos para negros. Por que a branquitude insiste em responsabilizar negros pela perpetuação do racismo, enquanto não enxergam seu papel no problema?
Ao falar de políticas de ações afirmativas, ela não se reduz apenas as cotas para os negros, cabe destacar. A questão central colocada é a integração negra na sociedade de classes. O intelectual branco Florestan Fernandes tratou disso, em uma de suas últimas entrevistas para Folha, disse, o livro Integração do negro “é a obra mais importante que escrevi, todavia, trata-se de uma integração que não houve”. Logo, as políticas de ações afirmativas colaboram minimamente com a integração dos negros e das negras nesta sociedade. No primeiro momento o branco de direita e o branco de esquerda eram contra a proposta. No segundo momento, o branco de esquerda procura adicionar a pauta ao seu discurso e prática. Enfim, elas têm se mostrado realmente válidas para que a comunidade negra ingresse, por exemplo, na universidade como estudantes.

As políticas de ações afirmativas no mercado de trabalho público e especialmente privado é uma outra questão. Com as políticas neoliberais, a estratégia de enxugamento do Estado, diminui o número de empregos e reduz os salários (seja até por causa da perda do poder de compra) de funcionários públicos que não possuem poder como os juristas. Assim, o espaço que resta é o privado, as empresas particulares têm terceirizado os seus meios de produção há décadas, os trabalhadores a cada dia que passa perdem seus direitos trabalhistas e sociais.

Racismo sem raça

Estamos vivendo de forma mais intensa a precarização do trabalho para além da terceirização que é a “uberização” do trabalho. Isto é, as pessoas sendo exploradas de forma mais agressiva ao receber pouca contrapartida ou praticamente nenhuma, enquanto a poderosa empresa Uber já discute o projeto de carros elétricos voadores autônomos.

O desemprego no Brasil está enorme, razão da pandemia, todavia, também em virtude desse governo branco de ultradireita (branquitude acrítica) que não é desgoverno, e sim, a pior gestão possível para os pobres, “kakistocracia da kakistocracia”, “o pior do pior para os pobres”. Em suma, na sociedade capitalista, o desenvolvimento técnico-científico é utilizado não a favor da sociedade global, e sim, para o lucro do capitalista. Diante disso, o desemprego tende aumentar cada vez mais, o humano é substituído de forma mais brutal pela máquina, se não precisamos mais de cobradores para o ônibus, em breve, (ou neste instante) também não precisaremos do motorista. Com o aumento do desemprego as pessoas mais afetadas são os negros e as negras.

Na busca pelo emprego, o branco, em regra, possui a vantagem na concorrência com o negro de conseguir a vaga. Trata-se da sobrevivência, com o aumento do desemprego o branco possui a vantagem racial de sobreviver mais do que o negro e a negra. Todavia, o desemprego atinge e atingirá todos, mas, os primeiros afetados sempre estão na comunidade negra. Por isso, na sociedade de classes as políticas de ações afirmativas, como a iniciativa da Magazine Luiza, são válidas e importantes para minimizar o número de negros e negras desempregados em todas as funções, não apenas em cargos de chefia.

Contudo, não podemos deixar de discutir também no Brasil a questão do desenvolvimento tecnológico e diminuição dos postos de trabalho. Uma das alternativas encontradas é o “Projeto de Renda Mínima”, discussão significativamente relevante. Porém, há outras possibilidades de pautas para o debate, caso da redistribuição da riqueza nos espaços locais e globais. Obviamente que a opção tenderá a caminhar para o “Projeto de Renda Mínima” que pode servir como docilização ou conformação dos pobres. O propósito será tentar evitar a rebelião daqueles que não dormem porque estão famintos. Milton Santos já nos alertava sobre isto.

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(Arte/Redação)

Como você enxerga atores políticos negros proeminentes, como o vereador paulistano Fernando Holiday, ou Sérgio Camargo, diretor da Fundação Palmares, que reproduzem discursos que falam contra as cotas raciais e à negritude, e que pregam o fim do racismo apenas ignorando que ele existe?
O Brasil se deparou com o negro de direita e com o negro de ultradireita. O negro de ultradireita é um contrassenso, o negro de ultradireita em parceria com o branco de ultradireita, um paradoxo. Não me interessa tratar de personagens, e sim, do universo ideológico político e a raça, a branquitude e a negritude. Quanto ao negro de direita, a sociedade agora está mais atenta com essa figura. O negro de esquerda sempre apareceu mais no cenário político público, a negritude de esquerda que é escanteada pela branquitude de esquerda em todos seus espaços: mídias alternativas, partidos políticos, governos, ONGs, sindicatos etc. Para ilustrar, ao olharmos as mídias de esquerda, todos os seus espaços estão ocupados pelo branco de esquerda, o negro aparece enquanto exceção. A branquitude de esquerda em palavras e ações propõe um mundo mais justo ou justo, ao mesmo tempo em que aplicam o racismo. O branco de esquerda descobriu agora o negro de direita, em virtude disso, sempre perguntam aos poucos negros de esquerda que aparecerem nas suas mídias para falarem a respeito dos negros de direita e ultradireita.

O negro de direita e de ultradireita foram oportunistas ao falarem contra o movimento negro. Isto deu repercussão, inclusive pela resposta que receberam, houve barulho nas redes sociais, no palco da internet, o contexto social reacionário foi favorável, essa teia de fatores colaborou para que o negro de direita fosse eleito. O marketing funcionou de forma perfeita. Quanto ao negro de ultradireita num governo de branquitude acrítica? A relação é de hierarquia, o branco de ultradireita manda, o negro de ultradireita obedece, suas palavras não importam se são necessariamente suas. O que pretende é reproduzir aquilo que o seu chefe branco gostaria de ouvir. O corpo é negro, todavia, a cabeça é branca. E dirigimos nossas críticas, às vezes, somente ao corpo negro que é um subordinado obediente à branquitude acrítica (cabeça branca). O negro de ultradireita que faz isto, obviamente, colabora de forma ativa com a política de morte destinada a comunidade negra.

Mas, este negro de ultradireita individualista, mostra que somente se importa com ele mesmo. Logo, tudo bem que o negro e a negra morram desde que não seja ele. É evidente que um dia o destino trágico igualmente lhe alcançará. O branco de ultradireita despreza todos os negros inclusive os negros e as negras de direita e de ultradireita. A negritude de ultradireita é um paradoxo analítico e existencial.

Neste governo realizar uma crítica a qualquer um dos seus componentes, deixando de lado o comandante-chefe, chega a ser ridículo. Lembrando que todas as pessoas que fazem parte dessa Administração escolheram participar por no mínimo alguma concordância com a ideologia deste governo branco de ultradireita. Não se trata apenas de oportunismo, as vantagens de ser ministro. Contudo, existem nos seus quadros o número de quase cem por cento branco. E nos perguntam pelos poucos negros que lá estão?

“Este negro de ultradireita individualista, mostra que somente se importa com ele mesmo. Logo, tudo bem que o negro e a negra morram desde que não seja ele. É evidente que um dia o destino trágico igualmente lhe alcançará. O branco de ultradireita despreza todos os negros inclusive os negros e as negras de direita e de ultradireita. A negritude de ultradireita é um paradoxo analítico e existencial”

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Ainda falando sobre isso, porque manifestações como Black Lives Matter causam tantas reações negativas na população, enquanto manifestações pró-Bolsonaro, anti-lockdown e anti-ciência são tratados apenas como uma espécie de devaneio de uma parcela alienada da população?
A mídia hegemônica brasileira de forma geral considerou justo o Movimento Vidas Negras Importam, os meios de comunicações alternativas igualmente. Soubemos do assassinato de George Floyd pela imprensa e ficamos todos indignados (quase todos). Essa foi a regra. O presidente Trump e o movimento trumpista quiseram minimizar o crime. Essa foi a estratégia eleitoral do ex-presidente estadunidense. O então candidato, Joe Biden, seguiu sentido oposto. Entre as escolhas de estratégias, o resultado mostrou que Biden fez a opção mais eficiente. Aqui no Brasil, o atual presidente e seus “fiéis” seguiram na mesma linha, cumprindo uma hierarquia. O ex-presidente dos EUA manda no presidente em questão do Brasil e ele manda nos seus seguidores (e deseja mandar em todos os brasileiros sem contestação). A postura do presidente brasileiro de plantão não é novidade. Quanto aos outros segmentos sociais? O discurso foi realmente de apoio às passeatas que ocorreram no território norte-americano. Em várias partes do mundo ocorreram manifestações de apoio ao Black Lives Matter, o Brasil seguiu no mesmo sentido. Os brancos das classes média e alta mostraram-se sensibilizados e dispostos a ação.

Porém, esperamos a mesma atitude em relação a morte de crianças, jovens, adultos negros e negras praticado pela polícia todos os dias. Enquanto isso não acontece, podemos supor que a branquitude brasileira de direita e de esquerda, especialmente a de esquerda, em essência imitaram os brancos progressistas estadunidenses. Infelizmente, ainda não estão se importando com as vidas negras brasileiras, digo isso em regra, não em exceção. Eu, enquanto negro de esquerda, dirijo com maior frequência a minha crítica ao branco de esquerda, pois enquanto esquerda almejamos, lutamos por maior justiça e igualdade se comparado com a branquitude de direita. Logo, as práticas de racismo institucional, perpetradas pela branquitude de esquerda, são um obstáculo considerável para efetivarem os seus ideais, sejam eles expressos em discursos ou em outras práticas concretas cotidianas.

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Aliás, pedir que se ignore o racismo está no cerne do discurso neoliberal, através da meritocracia, e também do discurso nacionalista totalitário, quando se diz que “somos todos brasileiros”.
O ato de ignorar o racismo faz parte da história brasileira. Aquele que enfrenta a opressão/exploração é quem acaba por visibilizar a violência. A ideia de paraíso racial ainda é muito utilizada em nossa sociedade. O governo português na sua relação com os países africanos colonizados, difundiu a ideia de lusotropicalismo, lusofonia. Isto é, a invisibilização dos conflitos raciais. Em nosso país, neste instante, o ocultamento da prática racista aparece na difusão do fake News e na ideia de pós-verdade. Por outras palavras, seria mentira que o racismo opera no por aqui, ou que tenha existido em algum período. A administração do presidente Fernando Henrique Cardoso reconheceu oficialmente o racismo no Brasil em 2001. Porém, para a mentalidade da presidência em exercício, trata-se de um equívoco, pois como reconhecer aquilo que nunca existiu?

A grande mídia brasileira – e provavelmente mundial – sempre foi quase exclusivamente branca. Hoje, o esgoto da internet também revelou diversas personalidades influentes da extrema direita branca, que acabaram impulsionando a polarização nacional e o discurso que acabou colocando Jair Bolsonaro no poder (e, até agora, mantendo-o na presidência). Como a comunicação, seja o jornalismo, a publicidade, o entretenimento, funcionam na perpetuação do racismo?
A sua pergunta já contém parte da resposta. A mídia, quase exclusivamente branca, defende os interesses dos brancos, muitas vezes em detrimento aos negros e as negras. A questão dos veículos tradicionais (antes da força dos veículos frutos da Internet), aparentemente estão em tendência de queda, os novos meios são mais fortes, veículos como Facebook, Netflix, Twitter são aqueles que estão em tendência de crescimento. A Globo, principal veículo de comunicação do país, está tentando se enquadrar neste mundo novo com a Globoplay. Porém, a Netflix saiu na frente, as produções dela são em maior quantidade e qualidade que o Grupo Globo. O SBT, Record, Band parecem que ainda não se atentaram em concorrer com grupos de streaming, logo, estão perdendo “o bonde da História”, o Grupo Globo está mais atento. Os seus concorrentes citados (caso do SBT) possuem um planejamento que não conseguimos enxergar de forma explícita.

No universo de produção de conteúdo para essas empresas de comunicação existe uma fatia enorme. Chega a ser infinito o espaço a ser preenchido por conteúdos negros, conteúdos não-brancos, para serem exibidos para a comunidade do território brasileiro. Pois, aqui somente nos oferecem em regra o mundo branco, o universo, das cidades do Rio de Janeiro, São Paulo e no máximo Salvador. Há uma lacuna de materiais jornalísticos e de entretenimento não-branco a ser exibida em nosso território para além dessas cidades citadas. O choque entre o jornalismo e o mercado? Arte (e o entretenimento) e o mercado? É um dilema secular persistente que enfrentam os jornalistas, os profissionais da comunicação e os artistas. O próprio Karl Marx viveu isso. O jornal pressiona o Estado (o governo), o político liga para o dono da empresa, eles fecham um acordo entre si, diante disso o jornalista é demitido ou “adestrado”.

Quanto aos novos veículos de comunicação e tecnológicos como Facebook, YouTube, Twitter? São absurdamente poderosos, e os empresários donos dessas empresas podem interferir, ou mesmo manipular, os processos de escolhas políticas nos países que permitirem sua hospedagem. Há outros exemplos, porém, fiquemos em dois, a eleição do ex-presidente estadunidense Donald Trump e do presidente brasileiro atual. Esses novos veículos foram fundamentais, inclusive para desqualificar os adversários ao destruir reputações, ao fazer uso de um número elevado de mensagens falsas, ou mesmo ao distorcer a realidade, ou de fato mentir quando essa estratégia for melhor do que a verdade dos acontecimentos. A discussão colocada como pós-verdade. Há uma indústria muito bem organizada de produção de fake news, logo, o mundo está mais complicado.

Diante de tantas mudanças, o que permanece? Tirando os chineses, a branquitude estadunidense são os burgueses proprietários dessas empresas bilionárias e poderosas em maior quantidade. O poder é tamanho que foi capaz de banir o ex-presidente Donald Trump de publicar nos seus espaços mesmo quando ainda era presidente. Sim, ele estava de saída, mas, ainda era presidente dos Estados Unidos, a nação, por enquanto, ainda a mais poderosa do mundo em termos bélicos, econômicos, técnico-científico etc.

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A população brasileira é majoritariamente preta e parda, a mestiçagem está presente na nossa história desde que os colonizadores pisaram aqui pela primeira vez. Como o processo histórico tornou boa parte dos mestiços brasileiros em acríticos do racismo, ao passo que uma enorme parcela da população mestiça hoje compartilhe de ideias extremistas brancas?
A mestiçagem está presente na história de todos os grupos humanos. A partir do pressuposto que os homo sapiens sapiens surgiram no continente africano, os nossos ancestrais imigraram, todos passaram por processo de mestiçagem cultural e biológica. Não existe o oposto do mestiço, por outras palavras, “o ser puro”. A construção social da ideia do que é ser branco e ser negro é produto dessa história. O equivocado, que se considerava puro, se nomeou branco e nomeou o outro como negro (impuro) durante o processo violento de contato entre grupos culturais distintos. Enfim, o termo mestiço possui história de usos e sentidos como todas as outras classificações sociais. O branco acrítico (o branco de ultradireita) é aquele que persiste com o discurso de que possui uma pureza racial. Ou seja, seria um branco puro. Ele vai defender esse discurso por ignorância, conveniência, mentira ou defesa dos seus interesses e vantagens raciais.

A internet é hoje o principal veículo de distribuição de ideias racistas no mundo? Embora os indicadores sociais de violência contra negros já tenham piorado muito na última década, você acredita que eles continuarão nessa tendência?
Na verdade, teria que olhar e analisar alguns dados para expor um prognóstico. O que é possível observar aos olhos do senso comum, o número de violência contra negros, inclusive os assassinatos não tem arrefecido mesmo com a pandemia. Os negros têm morrido em consequência do vírus e também por armas de fogo. Nas grandes cidades, a política de Segurança Pública, significa uma política de Insegurança quase total para o homem negro e em menor porcentagem para mulher negra. A mulher negra e, igualmente a branca, que também é atingida pelo feminicídio, praticado pelo homem de distintos pertencimentos étnico-racial. Parece que a situação não é pior por causa das ações meritórias das organizações da sociedade civil do que pela ação do Estado. Se algumas dessas ações, diante da demanda, significam em termos estatísticos enxugar o gelo. Contudo, para o indivíduo que foi alcançado pode significar a salvação de sua vida.

Posto isso, a tendência é desanimadora. Por causa da falta de vontade política de muitos governos, por causa do endurecimento do discurso, isto é, a defesa da utilização das forças policiais para reprimir as diversas reivindicações sociais. Realmente, a tendência é desanimadora, porque os efeitos da pandemia e a omissão do governo já estão presentes. O pior tende a piorar. O nível alto de desemprego e aumento da miserabilidade tendem a não diminuir. Mesmo porque, vivemos um período de “kakistocracia da kakistocracia”, o pior do pior dos governos na administração pública federal. Portanto, infelizmente, tudo tende a piorar. Porém, estamos na luta apesar de tudo. A nossa luta do momento tem como prioridade a sobrevivência. Nesses dias que muitos morrem diariamente no Brasil e no mundo. Estamos encontrando o nosso fim a bala, por falta de oxigênio e outras consequências da covid-19. Ante o “pessimismo da realidade” vamos seguir com o “otimismo da vontade”, admitindo que não está fácil.

“Por causa da falta de vontade política de muitos governos, por causa do endurecimento do discurso, isto é, a defesa da utilização das forças policiais para reprimir as diversas reivindicações sociais. Realmente, a tendência é desanimadora, porque os efeitos da pandemia e a omissão do governo já estão presentes. O pior tende a piorar. O nível alto de desemprego e aumento da miserabilidade tendem a não diminuir”

Existem teóricos que defendem que a liberdade de expressão deveria acabar quando o interlocutor está difundindo abertamente ideias supremacistas. Você acredita que deveríamos responsabilizar criminalmente parte desses comunicadores de extrema direita de hoje?
Não sou jurista, contudo, existe o óbvio. Na medida em que você defende ideias de superioridade racial branca, a partir de pressuposto de inferioridade racial não-branca, você praticou o racismo, cometeu um crime. A pessoa fez uso do direito da liberdade de expressão para praticar um crime. Para ilustrar, no filme de 2001: Uma Odisseia no Espaço, o personagem homo sapiens utiliza um pedaço de osso como instrumento eficiente na caça de animais para alimentar sua família. A técnica será utilizada para caçar. Porém, em outra cena, o osso será utilizado pelos mesmos homo sapiens para matar seu semelhante finalizando uma briga. O mesmo objeto foi utilizado para outro fim.

O osso, antes utilizado como técnica para a preservar a vida, foi utilizado como técnica para provocar a morte. No desenrolar da História, o emprego de instrumentos técnicos para matar humanos e não-humanos passou a ser considerado crime, ilegalidade, a partir do momento em que determinadas regras foram pactuadas. Posto isso, a branquitude acrítica pratica crime ao fazer uso da tecnologia da informação, e utilizam como justificativa o argumento de liberdade de expressão. Nessa perspectiva, o crime não seria crime? E sim, liberdade de expressão, um direito fundamental. Essa é a pauta que colocam ao usar da pós-verdade (da mentira). Vamos cair neste estratagema simplório? Se a pessoa pratica um crime que ela seja processada e tenha o seu direito de defesa assegurado.

O que significa brancura?

Hoje em dia, a luta progressista é abraçada por diversas populações consideradas minoritárias, como os negros, a comunidade LGBT, as mulheres – que, somadas, na verdade, são a maioria do nosso grupo populacional. De que maneiras todos esses grupos podem trabalhar juntos contra as violências cotidianas sem que eles se invisibilizem entre si?
Na verdade, quando você nomeia progressista, podemos entender como luta da esquerda de forma preponderante. Negros de esquerda, LGBTQI+ de esquerda, mulheres de esquerda de forma geral. Obviamente que encontramos atuação também nesse sentido e até realizações nos grupos e governos de direita. Todavia, é no universo político da esquerda que mais ocorre a atuação desses grupos. O principal empecilho encontrado então é o racismo institucional praticado pela branquitude de esquerda. A branquitude de esquerda que quando inclui outras pautas faz isso de forma marginal. Trata-se de uma “inclusão excludente” como defende o sociólogo branco de esquerda Boaventura de Sousa Santos. O pensador e poeta negro Carlos de Assumpção já colocou: “Quero estar em toda parte, quero ser bem recebido, basta de humilhações!”. O negro quer estar em toda parte.

Cabe a branquitude de esquerda “pensar” que ao fazer isto (quem sabe?) pararão de considerar que pontos que fogem do seu universo tradicional são pautas menores. Pensem, estudem para além das suas bibliografias brancas, brancocêntricas. Colegas brancos de esquerda, chega a ser no mínimo constrangedor vê-los vestidos com a camisa “imagine a dor, imagine a cor”, ao mesmo tempo em que, praticam o racismo institucional em seus espaços. Quanto a branquitude de direita? A análise é mais complicada. Considero também necessário analisá-los ao fazer uso das bases teóricas da psicologia social e da psiquiatria. Frantz Fanon e Maria Aparecida Bento contribuem com essa discussão. Ambos nos oferecem pistas para seguirmos. A questão da união entre os distintos grupos? Ao enfrentamos governos e grupos protofascistas nos aliamos de forma inevitável. A nossa aliança ocorre em ações e discursos. Caso contrário, todos morreremos em silêncio. A união já está acontecendo, é importante que aceleremos e que potencializemos ainda mais essa tendência.

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(Arte/Redação)

Quando você fala em branquitude acrítica e eu reflito sobre pessoas do meu círculo de convívio que apresentam esses traços, sinto que se trata majoritariamente de um grupo que não tem salvação, que não pode ser reeducado a pelo menos assumir sua brancura. Existem dispositivos para tornar essa massa acrítica em crítica, ou essa é uma luta que tem que ser fundamentada desde os primeiros dias da educação básica da população, uma construção para o futuro?
A educação é muito importante, mas não se trata somente desse aspecto da organização social para lidarmos com isto. Muitos optam pela opressão/exploração porque lucram com isto. O seu movimento é conservar a sociedade como ela é. Vão realizar no máximo algumas reformas. A característica de nossa sociedade ocidental é burguesa, capitalista e liberal. A educação igualmente opera dentro dessa lógica de forma preponderante. A educação é gerida de forma estratégica pelo Estado para que não ocasionar mudanças bruscas que ameacem a sociedade contemporânea burguesa.

Paradoxalmente é com a educação que aprendemos o valor e gosto pela liberdade e afirmação humana. Essa tendência é o efeito “colateral que o sistema fez”, assim como canta Mano Brown. A educação como “efeito colateral do sistema” é aquela que move sua ação para mudar o mundo para melhor na perspectiva humana. A perspectiva de Educação que vem de “baixo para cima” é fruto dos movimentos sociais, por exemplo. Trata-se da Educação para liberdade que entra em choque com a Educação fortemente regulada pelo Estado. O fruto desse embate já indica uma perspectiva melhor do que a perspectiva educacional oficial, aquela imposta de “cima para baixo”.

“Colegas brancos de esquerda, chega a ser no mínimo constrangedor vê-los vestidos com a camisa ‘imagine a dor, imagine a cor’, ao mesmo tempo em que, praticam o racismo institucional em seus espaços”

Assim como aprendemos com Milton Santos “a globalização de baixo para cima” é mais do que necessária. A ação dos movimentos sociais e a rebelião dos pobres são fundamentais para escaparmos do morticínio. Estamos encontrando o nosso fim pela ação e omissão dos governos. Quanto a perspectiva pessimista? Para o pobre a ótica de que não tem solução, coloca somente como alternativa a conformação. O ato de se conformar com sua tragédia. Se conformar com o horror. Ir para o cadafalso em silêncio. Na verdade, o mundo não precisa do número elevado de pobre que possui. Isto, obviamente, na perspectiva branco-burguesa, liberal, capitalista. Portanto, o momento está péssimo de fato para os pobres, para os negros. Vamos seguir com o “otimismo da vontade”. Somos a mudança, colocaremos outras alternativas para convívio social. Pois nos recusamos a morrer. Nos recusamos a falecer de fome, de bala, das consequências do vírus da covid-19. Se a Educação hegemônica pretende nos alienar em algum aspecto? Optamos pela outra perspectiva de Educação. Uma Educação rival, uma Educação para liberdade. Uma pedagogia que não marginaliza a nossa luta e coloca novamente em pauta a discussão sobre revolução. A revolução nesta sociedade complexa do século XXI.

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(Arte/Redação)

Você acredita que esse futuro chegará em algum momento em nosso país?
Muitos estão na luta por um mundo melhor, um outro mundo com a perspectiva de humanidade autêntica. Isto no Brasil e no mundo. Vamos seguir nessa vereda. Na maneira como organizamos as pessoas e as coisas, o passado já foi e o futuro chegou neste instante, tornou-se presente. Há lutas diversas para serem travadas com o objetivo de um mundo melhor. Continuaremos nesse caminho.

No caso de nossa sociedade, nessa perspectiva de “integração do negro na sociedade de classes”, o movimento negro, os acadêmicos negros têm tencionado os espaços de produção do conhecimento. Em virtude disso já observamos um movimento de autoproteção branca. Em outras palavras, uma articulação branca para conservar as vantagens que possuem por serem brancos, vantagens/privilégios raciais nas academias e outros espaços que circulam. O que nos compete fazer neste presente-futuro é continuar na pressão, na luta por mudança. Para ser mais concreto a respeito desta autoproteção branca abordarei o tema branquitude acadêmica, essa temática também tratei no meu último livro O branco ante a rebeldia do desejo. O objetivo do livro foi analisar o branco pesquisador que sempre investigou o negro enquanto tema (ou objeto) científico.

O branco cientista estuda o negro, portanto, o negro é seu tradicional “objeto” científico. Durante muito tempo sendo tratado como “coisa”, exatamente isso. O negro e a negra entraram na universidade, no primeiro momento, serão formados pelos brancos, no segundo período, serão formados por negros e por brancos, apesar de que na universidade permanece a hegemonia branca. O negro acadêmico passa a estudar o negro, assim como o branco já estudava. Diante disso, o caminho natural foi olhar para outra direção, olhar o branco, problematizar o branco, não se restringir apenas ao negro, a negra sua história, cultura, etc. Sou produto desse momento de inversão metodológica que foi inaugurado pelo pensador negro Guerreiro Ramos. Uma questão fundamental que se coloca em meu livro é a seguinte: por que o branco pensa o negro e não pensa em si?

Agradecimento para Rita de Cassia Alencar da Silva, que auxiliou Lourenço Cardoso na revisão textual de suas respostas

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