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Maconha, ansiedade e suas relações complexas

Um paradoxo de causa e cura marca a união entre cannabis e ansiedade. Por quais motivos isso acontece?

por Girls in Green Atualizado em 17 set 2021, 11h06 - Publicado em 16 set 2021 23h42
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(João Barreto/Ilustração)

uem ainda não é tão familiarizado assim com a cannabis pode até não saber, mas, quando o assunto são seus efeitos, encontramos um mundo de infinitas possibilidades. Uma mesma substância, na mesma dosagem, pode render viagens por caminhos diversos e isso é, ao mesmo tempo, fascinante e um pouco assustador. Também é o motivo pelo qual, enquanto alguns usuários relatam uma diminuição na ansiedade ao consumir, outros podem perceber os sintomas de crise aumentarem. E, em um contexto proibicionista e pandêmico, essa confusão pode se acentuar ainda mais.

Aproveitando a bolha canábica que construíram no Instagram, a Girls In Green, plataforma digital especializada em produção de conteúdo e educação canábica, fez uma pesquisa, respondida por mais de quinze mil pessoas, para tentar solucionar essa questão. Ao questionar sobre o quanto os usuários se consideravam ansiosos, 91% responderam que sim. Metade ainda confirmou que já teve uma crise de ansiedade após consumir maconha. Destes, 76% diz que se isolou em momentos de crise por receio de julgamentos ou estigmas, e 56% não conta com acompanhamento psicológico ou psiquiátrico – por razões que vão de condição financeira a medo de reações preconceituosas.

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Afinal, ela é a “cura” ou a “causa”?

É desafiador pensar de forma tão dicotômica. A verdade é que os efeitos que você irá experimentar dependem de muitas coisas além da sua maconha. Por isso, ela pode fazer os dois papéis em cenários e corpos diferentes. Mas é importante retomar os detalhes e destrinchar alguns conceitos.

De acordo com especialistas do Hospital Albert Einstein, as pessoas com ansiedade podem apresentar sintomas nos mais diversos âmbitos. No comportamento, a hipervigilância, inquietação e irritabilidade são alguns dos mais comuns. Outros sinais de crise envolvem falta de concentração, pensamento acelerado ou pensamentos indesejados; fadiga ou suor; falta de ar ou respiração rápida; insônia ou pesadelos; preocupação excessiva, boca seca, medo, náusea, palpitações, sentimento de tragédia iminente ou tremedeira.

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(João Barreto/Ilustração)

“Pessoas com ansiedade podem apresentar sintomas no comportamento como hipervigilância, inquietação e irritabilidade são alguns dos mais comuns. Outros sinais de crise envolvem falta de concentração; fadiga ou suor; falta de ar ou respiração rápida; insônia ou pesadelos; boca seca, medo, náusea e palpitações”

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E como a cannabis pode ajudar?

Uma pesquisa feita em 2017 por cientistas das universidades da Califórnia, Columbia, do San Francisco Veterans Affairs Medical Center e o Northern California Institute for Research and Education com mais de 9 mil americanos concluiu que 81% dos entrevistados acredita que a cannabis tem pelo menos um efeito positivo para a saúde – sendo o alívio da ansiedade o mais citado. Entretanto, no mesmo estudo, um número expressivo de usuários relata uma piora em sua ansiedade devido à maconha.

Para entendermos onde esse paradoxo surge, precisamos lembrar que a cannabis é composta por uma gama ampla de canabinoides – cada um com determinados efeitos terapêuticos. Os compostos mais conhecidos são o tetrahidrocanabinol (THC) e o canabidiol (CBD). O THC é responsável pela sensação de chapadeira que a erva dá – ele tem inúmeros benefícios terapêuticos e, em pequenas concentrações, potencializa o efeito do CBD. Já o CBD, diferentemente do THC, é um ativo não-intoxicante responsável por efeitos mais calmantes. O que também sabemos é que o THC, quando em grandes quantidades, pode ser responsável pelo sentimento de paranoia, e, por consequência, de ansiedade. Entretanto, por causa de algo chamado efeito entourage, o CBD ajuda a suavizar os efeitos negativos do THC.

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(João Barreto/Ilustração)

É por isso que, quando se trata de espécies com alto teor de THC, há uma coisa a considerar, com base em estudos: em doses mais baixas, a cannabis pode ajudar na ansiedade; em doses mais altas, pode piorar. Atualmente, contamos com um grande movimento na busca das canabinoides e terpenos em sua forma mais pura. Extratos feitos com solventes ou sem podem chegar até mesmo a 80% de THC. Tal fato aponta um desafio, e temos que ficar atentos aos sinais do nosso corpo quando existe o consumo elevado de THC.

Mas não é só a concentração de THC que é importante. Em 1964, Timothy Leary introduziu um conceito chamado “set and setting” em seu guia para a ingestão de psicodélicos The Psychedelic Experience: A Manual Based on the Tibetan Book of the Dead (“A experiência psicodélica: um manual baseado no livros dos mortos tibetano”, em tradução livre). Segundo o autor, o setting consiste no ambiente físico no qual o indivíduo se encontra para o consumo da substância. Já o set é mais relacionado com o estado mental que o sujeito se encontra na hora de fazer o uso. Assim, a qualidade e potência da substância se tornam tão importantes quanto o set e o setting para determinar como será a experiência do indivíduo. Quando pensamos na questão da ansiedade, esse é um fator determinante.

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(João Barreto/Ilustração)

Quando não é possível determinar a qualidade

No Brasil e em inúmeros outros países, a proibição da nossa amada ganja também atrapalha quem busca os efeitos medicinais da cannabis. Um dos maiores problemas é que não temos acesso às mesmas variedades que os países onde a planta é legalizada. Por isso, é muito difícil saber e comprovar o que, de fato, é consumido.

Se você é usuário de maconha, seja seu uso crônico ou esporádico, você deve lembrar que o efeito dela depende muito do seu estado mental no momento do uso. Portanto, se você está sentindo algum tipo de desconforto ou sinal de ansiedade aumentado, procure entender se esse é o momento certo de consumir uma cannabis com níveis elevados (ou desconhecidos) de THC. Você está passando por um momento especialmente estressante? Você já percebeu esse tipo de sintoma antes na sua vida?

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(João Barreto/Ilustração)

O autocuidado e a redução de Danos vem de dentro para fora – isso quer dizer que sua experiência pessoal, que é subjetiva, é o que conta nesse momento. Então, se você entender que ela está causando mais mal do que bem, reduza o seu uso – ou busque por outras formas de utilizá-la para auxiliar em tal processo, como óleos de cannabis ricos em CBD.

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Também é preciso entender que a ansiedade é algo que precisa ser acompanhado de perto, principalmente por um profissional da área da saúde. Sem mudanças no estilo de vida ou trabalho para melhorar sua saúde mental, se seus estressores ou gatilhos de ansiedade persistirem, os sintomas irão permanecer.

Pensar em estratégias preventivas, como psicoterapia, exercício físico, boa alimentação, contato com a natureza, meditação ou ioga, pode ajudar a cuidar do nosso corpo e dar um tchauzinho para essa sensação que é pra lá de desconfortável.

“Com base em estudos: em doses mais baixas, a cannabis pode ajudar na ansiedade; em doses mais altas, pode piorar”

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Se a crise apertar… mantenha a calma!

É possível amenizar seus sintomas até que eles sumam com alguns truques:

Primeiro, lembre-se: você não está morrendo. Uma crise de ansiedade pode apavorar, mas é uma sensação que vai passar. Só ter essa consciência já ajuda – já ouvimos muitas histórias de pessoas que foram parar no hospital achando que estavam tendo um ataque do coração. Preste atenção na respiração. Um dos primeiros efeitos da crise é a respiração rápida e desregulada, que pode levar à hiperventilação. Se isso acontecer, faça o exercício 4-7-8: usando apenas as narinas, inspire completamente em 4 segundos, segure o ar durante 7 e solte lentamente em 8. Repita esse ciclo como um exercício por 20 rodadas e, durante ele, procure relaxar a sua musculatura. Volte sua atenção a cada músculo do corpo e vá mandando sinais para soltar a tensão.

Com a respiração controlada e os músculos relaxados, é hora de distrair a sua mente. Esse método depende muito de você. Pense em algo que relaxe e faça bem a você – pode ser um banho quente, óleo essencial de lavanda, chamar o pet para deitar na cama com você. O importante é se sentir bem e em segurança.

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(João Barreto/Ilustração)
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E se a ansiedade persistir?

Quando uma crise de ansiedade acontece, lembre-se: você não precisa passar por isso só. Chame alguém para ajudar na hora, e depois busque um acompanhamento médico e psicológico. Não fujam da terapia: a medicação trata apenas o sintoma, e não a origem dele! A ansiedade ainda pode ser sinal de problemas como a síndrome do pânico ou transtorno de ansiedade generalizada. Um dos tratamentos mais comuns é a Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC). Este tipo de terapia é focada no ensino de como identificar e substituir modos negativos de pensar e reagir a situações. Você aprende a reconhecer quando os pensamentos não condizem com os fatos e quais são as maneiras úteis de pensar e reagir.

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(João Barreto/Ilustração)
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As imagens que você viu nessa reportagem foram feitas por João Vitor Barreto. Confira mais de seu trabalho aqui

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