ara o ator Alejandro Claveaux, 39, o gesto vem antes da palavra. Desde menino, ele enfrenta uma intensa batalha com a fala quando descobriu ser gago. Foram anos de tratamento em fonoaudiologia, mas sem esperança de superar o distúrbio neurobiológico por completo, diante da ausência de uma cura ou de único fator responsável.
Natural de Goiânia, Alejandro tinha planos de uma vida estável, com passos bem definidos até que descobriu o teatro. Foi um ato não planejado que o colocou em cima de um palco pela primeira vez, e o fez seguir pela estrada das artes cênicas. Na época, estudava Engenharia de Alimentos na PUC-GO e namorava uma estudante da mesma universidade. A jovem tinha o desejo de participar de um grupo estudantil de teatro e se inscreveu para a seleção. No dia do teste, ela chamou Alejandro para acompanhá-la, mas mal sabia ele que sua companheira havia inscrito os dois para a seletiva.
Uma prova é sempre um momento assustador, especialmente quando se trata de uma demonstração em que é necessário recorrer ao corpo, à voz e às emoções para convencer uma banca de críticos sobre o seu talento. No limite, significa dizer que você está apto ou não para fazer algo.
“A primeira vez que eu falei o texto ao vivo, eu não gaguejei. Pensei ‘caramba, eu gaguejo fora, mas não dentro do teatro”
Quando chamaram seu nome, Alejandro entrou em pânico. Foi empurrado pela namorada, essa já convencida de sua vocação, e não soube o que fazer. Não tinha nada preparado e nem experiência para se arriscar no improviso. Mas acima de qualquer preocupação estava o fato de ser gago. Essa era sua principal barreira. Tinha certeza que seria incapaz de atuar.
O ar preso no peito, o coração na boca: o pânico se converteu em lágrimas e nenhuma palavra saía. Mas a voz, contida até então, rompeu em um grito de angústia. Sua atuação fluía em estado cru de desespero misturado com a euforia de estar em cena. Havia também o desejo de se libertar de algo, algo que ele acreditava que o tornava menor do que os outros. E convém dizer que, das aflições humanas, a sensação de impotência é uma das mais aterrorizantes.
Mas ali, num momento quase imprevisto, ele se transformou na mais pura emoção. Por um instante, estava dominado por sentimentos. O que sentia era mais importante do que a plateia que o assistia. “Foi ali que entendi o que significa atuar”, ele conta, do outro lado do vídeo.
Ao fim, quando conseguiu voltar a si, notou uma bancada de homens e mulheres comovidos e atentos a ele. Estavam seguros de seu talento – até mais do que ele próprio –, sem sequer imaginarem o que se passava em sua mente.
Se esse fosse um consultório de terapia, é possível que esse episódio se tornasse algo como uma alegoria da vida de Alejandro. Ali, sua realidade virou do avesso. Foi aprovado em primeiro lugar na seleção, ele conta. Daquele momento em diante, percebeu que precisaria se dividir em dois ofícios que não tinham nenhuma ligação entre si.
Estabelecer-se numa carreira com a insegurança sobre o controle da voz e das palavras, junto à síndrome de impostor, além da instabilidade financeira, marcaram o início de sua caminhada. Em certo momento, Alejandro precisou fazer uma escolha e abandonar uma carreira estável para perseguir o sonho de ser e sobreviver como ator. Na época, aos 25, tinha uma fábrica de sorvete e vivia em Goiânia. Foi então que anunciou à família que iria embora para o Rio de Janeiro. A batalha pela estabilidade financeira e profissional estava prestes a começar novamente.