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Luísa Sonza está só começando

E vai cada vez mais longe. Poder feminino, saúde mental, metas para o futuro e seu "Doce 22" foram tema do nosso bate-papo com a cantora

por Alexandre Makhlouf Atualizado em 27 out 2021, 10h21 - Publicado em 25 out 2021 23h14
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(Clube Lambada/Ilustração)

o dia desta entrevista com Luísa Sonza, uma mensagem algumas horas antes mudou o rumo da conversa: horário desmarcado, Luísa foi assaltada em uma farmácia de São Paulo e não conseguirá comparecer ao bate-papo pelo Zoom. Morando em São Paulo desde que me entendo por gente, entendo bem a remarcação. Espero mais uma semana para, enfim, ficar cara a cara – ou tela a tela? – com uma das maiores popstars do Brasil atual. Luísa chega produzidíssima, unhas longas, delineado muito bem feito, moletom branco chic na medida que o dia frio pede. E muito mais simpática do que eu esperava, confesso. 

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Natural de Tuparendi, no Rio Grande do Sul, e com apenas 23 anos, dá pra dizer com tranquilidade que Luísa já chegou lá. Tem dois álbuns lançados, parcerias com grandes cantores e internacionais, foi a mulher escolhida para representar a colaboração de uma conhecida grife internacional com uma das maiores fast fashion do Brasil – Moschino para Riachuelo – e acumula quase 25 milhões de seguidores no Instagram. O checklist de conquistas veio, mas acompanhado de um peso que, em vários momentos, ultrapassou qualquer limite do bom senso e da humanidade. Luísa teve o fim de seu casamento escancarado na mídia e o machismo da mídia fez a corda estourar para o lado dela, claro. Foi culpada e cancelada por coisas que jamais seriam culpa dela, como no caso do filho de Whindersson – não vamos nos estender por respeito a todos os envolvidos. Tempos depois, em outro relacionamento, com o cantor Vitão, viu mais uma vez sua intimidade ser alvo de especulações e reconheceu, em entrevistas, que eles por vezes pensaram em terminar o namoro para ter um segundo de paz. Por outros motivos, o namoro acabou e a vida, claro, seguiu, mas não sem mais uma rodada de ataques.

Nada disso, no entanto, foi tema do nosso papo. Luísa é uma diva pop, tínhamos apenas 20 minutos para conversar e nos interessa falar dessa mulher de 23 anos que ganhou o Brasil, não do ódio que algumas pessoas má intencionadas direcionam a ela. Demos risadas, falamos sério e, em tão pouco tempo, deu pra sentir que Luísa está só começando. E vai cada vez mais longe. Confira nosso papo aqui embaixo:

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(João Kopv/Divulgação)

Saúde mental é uma pauta que nunca esteve tão em alta. Como uma figura pública, que está no seu patamar e passou por tantos ataques na internet, encontra tempo para cuidar da saúde mental? você consegue desligar em algum momento?
Acho que como todo mundo, não só como artista pop, eu me vejo tendo um trabalho como qualquer outro, com as dificuldades que todo trabalho traz. E ainda com privilégios, na real. Só não tenho tanto tempo, mas tenho acesso, que muita gente não tem. Faço tudo que eu quiser, um yoga, uma atividade física, difícil é só achar o tempo pra isso. Acho que como todo mundo que vive nesses tempos malucos, tento encontrar tempo para minha saúde mental para não deixá-la de lado. Tento dosar da melhor maneira, porque cuidar da saúde mental é uma coisa muito importante para todos nós. Às vezes escorrego e coloco algumas coisas na frente disso, mas me esforço para ter a saúde como um todo, mental e física, em primeiro lugar.

Li em uma entrevista sua uma coisa que me pegou: a Luísa que a gente vê nas redes e nos clipes é uma persona. qual a importância de fazer essa distinção para o seu público? Aliás, como é produzir para um público tão diverso?
Antes da diferença para o público, preciso ter pra mim. Como pessoa, preciso ter essa diferenciação. O artista em alguns momentos é muito paparicado, é muito sobre o ego. Quanto antes o artista se diferenciar, entender que o trabalho dele é igual aos demais, por mais que tenham milhões de pessoas aplaudindo, aquilo no palco é o alterego. Acho que essa frustração de muitos artistas vem disso – uma hora, você está no palco cercado de muita gente que te ama; no momento seguinte, você está sozinho. Quis buscar esse lugar de diferenciação até para manter minha arte o mais intacta possível, evitar que as coisas se misturassem de uma coisa que não fosse saudável. Ser artista mexe muito com a cabeça. 

“Acho que essa frustração de muitos artistas vem disso – uma hora, você está no palco cercado de muita gente que te ama; no momento seguinte, você está sozinho. Quis buscar esse lugar de diferenciação até para manter minha arte o mais intacta possível. Ser artista mexe muito com a cabeça”

Luísa Sonza
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Em relação ao público, imagina, se eu tenho dificuldade de diferenciar, sendo que são partes da mesma pessoa, principalmente por ter um trabalho muito subjetivo e visceral, obviamente também tem dificuldade de saber até onde vai a Luísa Sonza e até onde é só Luísa. Uma maneira fácil para mim de fazer isso foi definir o que é vida pessoal e o que é vida artística. Quanto estou trabalhando, sou essa persona Luisa Sonza. Nas entrevistas, tenho tentado falar sobre ela, mas conversar como Luísa. Ainda estou aprendendo a diferenciar e sei que nunca vai ter como dividir A e B. É um lugar um pouco líquido. Transito entre as duas, mas tento ser Luísa nesses momentos de troca. Afinal, é a Luísa que criou a Luísa Sonza, é a identidade por trás da pessoa. Me afastar da pessoa física pode até comprometer essa essência, lutar contra esse mal é um dos maiores desafios do artista. É uma nóia doida isso, uma coisa meio psicanálise, né? (risos)

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(João Kopv/Divulgação)

Por falar em público, você é muito forte entre os LGBTQIA+ e, sempre que pode, se posiciona a favor da sigla e contra os muitos retrocessos que vivemos no nosso país para essa população. Como você se aproximou do movimento e por qual motivo usa sua plataforma para ampliar a visibilidade para essa questão?
Acima de tudo, eu me sinto parte. É o ambiente em que eu vivo e onde me sinto confortável para me expressar. A identificação talvez seja, em especial e sobretudo, com o público de homens gays. Não sei exatamente de onde vem isso, mas a gente se identifica, se aproxima, tem muitas coisas em comum. Talvez a identificação com o feminino disso, com essa união do masculino e do feminino.. E o resto é o mínimo que eu faço como ser humano, né? Acho importante falar que me sinto parte, mas sem tirar o protagonismo das pessoas que pertencem às outras letras da sigla. Eu acho que vou pelo correto, que eu acredito que seja essa igualdade. É o mínimo, como cidadã, prestar esse apoio como aliada. Preconceito vai contra tudo que eu acredito. 

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Em boa parte das suas músicas – e acho que do pop brasileiro como um todo, aliás – o tema central voltou a ser a bunda, o rebolado, a sentada. ainda tem gente que acha vulgar cantar livremente sobre isso, mas vivemos um momento de empoderamento do corpo feminino. como é, para você, trabalhar, compor e dançar essas letras, se apropriando do seu próprio corpo? Como é sua relação com ele?
Queria fazer uma correção importante: o tema central não é a bunda, é a liberdade. Estamos num momento em que o feminino está tendo a liberdade que nunca teve. Por isso, – até completando a pergunta anterior – existe tanta identificação da comunidade LGBTQIAP+ com essa questão da diva pop. Querendo ou não, são formas de opressão ao feminino em vários lugares. Essa liberdade que nos é tirada, de matar o feminino, que nos faz criar essa identificação. Hoje, a gente também tem mais informação e coragem. Antes, não era dado às mulheres a oportunidade da conexão, da conversa, da troca e da união. Com o passar do tempo, a gente foi criando isso, se juntando e enxergando que as coisas não eram bem assim. O pop é um reflexo disso, e tô falando da história aqui, desse empoderamento das mulheres de entender nosso lugar como ser humano, de direitos iguais, nessa luta pela liberdade pelo respeito pelo corpo feminino, lutando por esse protagonismo. Quando nós estamos no topo, isso sempre incomoda. Nosso protagonismo como mulher é mal visto em todos os lugares. Sabe aquela frase “é feio mulher que…”? É isso. Eu, assim como todas as mulheres, sigo buscando essa equidade. Não só enquanto mulher, mas penso numa sociedade mais igualitária para todos. É um momento de força para nós graças à nossa coragem. O pop no brasil tem e teve mulheres muito fortes e muito corajosas, e é muito especial poder fazer parte disso sendo tão nova. Eu sou a que chegou agora (risos) e sei que muitas mulheres tiveram que passar por muita coisa para que eu pudesse estar aqui hoje. A luta continua, é de todas nós e é sobre liberdade, mostrando ou não a bunda.  

“Eu, assim como todas as mulheres, sigo buscando essa equidade. Não só enquanto mulher, mas penso numa sociedade mais igualitária para todos. É um momento de força para nós graças à nossa coragem. O pop no brasil tem e teve mulheres muito fortes e muito corajosas, e é muito especial poder fazer parte disso sendo tão nova”

Luísa Sonza

Seu último álbum, Doce 22, é dividido em Lado A e Lado B. Queria que você me contasse um pouco sobre o processo criativo por trás dele: desde os hits mais dançantes até as músicas mais pessoais, a divisão dele em dois lados…
Doce 22 é um álbum muito visceral pra mim, foi feito de uma maneira muito pessoal. Não pensei em nada enquanto tava fazendo ele: não pensei no conceito, se ia ter dois lados, nada. Pensei na quantidade de músicas que seria interessante para contar a história que queria. E ele sempre teve 14 músicas. Minha intenção sempre foi contar uma história, um relato de como eu estava me sentindo com 22 anos. É um álbum despretensioso. O que se formou como conceito depois veio a partir do que eu deixei fluir antes como artista, como nunca havia deixado fluir antes, sem pensar em absolutamente nada que não fosse o que eu estava sentindo. Quando eu entendi como me sentia em relação às coisas que estavam nas músicas, foi aí que entendi que existiam dois lados: a persona e a Luísa do Lado B, que eu nunca tinha mostrado tão claramente. Eu já entendia que terminaria o disco com esses dois lados, porque eu sou como sou, me conheço (risos). São dois lados da mesma moeda, mas que no fundo falam a mesma coisa. “VIP” e “Melhor Sozinha”, no fundo, são sobre a mesma coisa, mas com perspectivas diferentes. Uma delas é a persona, que tem tudo muito definido, é isso e pronto, não se aprofunda muito naquilo que está sentindo. Quer amor, mas está com os olhos no game ainda. A outra, de “Melhor Sozinha”, sabe que tem outras prioridades na vida dela, mas ela não deixa de querer esse amor. Uma Luísa vai pela razão, a outra pela emoção, e elas duas são reais. Eu sou uma pessoa que pondera isso tudo e, no final, decide. Mas, para explicar para as pessoas de maneira que elas entendessem e não deixar o álbum uma bagunça – a bagunça que sou eu na vida real –, fiz essa escolha mais coerente, até sonoramente falando. Hoje, inclusive, já mudei muito da Luísa com 22. Agora, com 23, já vejo muita coisa diferente. A intenção da nossa vida é evoluir, né?

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(João Viegas/Divulgação)

22 anos ainda é o início da vida, mas você começou tão cedo – e tem uma trajetória de ascensão tão grande – que muita coisa já rolou. Como você se vê aos 30? O que espera ter alcançado até lá?
Eu quero estar resolvida emocionalmente, muito tranquila. Estar com boa parte ou quase todos os meus objetivos alcançados. Acho que principalmente bem resolvida emocionalmente mesmo, viu? (risos). De resto, o universo sabe o que é melhor pra mim.

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